MEMÓRIA
Audiência
Pública DIREITO DAS MULHERES À NÃO DISCRIMINAÇÃO RACIAL E DE
GÊNERO
1. A
Procuradora Federal dos Direitos do Cidadão, Gilda Carvalho, no
âmbito do Procedimento Administrativo nº 1.00.000.014485/2010-43,
cujo escopo contempla o planejamento estratégico de acompanhamento
do tema dos direitos das mulheres, no exercício de suas atribuições
legais e constitucionais, abriu a Audiência
Pública sobre políticas e ações públicas de promoção do
direito das mulheres à não discriminação, racial e de gênero, na
Comunicação e na Educação. A Audiência teve seu início adiado
das 9:00 para as 14:00 h, no dia 07 de dezembro de 2011, auditório
do Conselho Superior do Ministério
Público Federal, Procuradoria Geral da República - SAF Sul, Quadra
04, Conj. C, Bloco A, cobertura – Brasília/DF.
2. Convidados,
o Ministério das Comunicações e a Secretaria de Políticas para as
Mulheres não puderam comparecer. Além destes dois convidados, uma
das palestrantes não pôde estar presente por motivo de saúde. Por
estas razões, o programa da Audiência foi condensado e realizado no
período da tarde. Registre-se a presença de representante do
Cfemea, em atenção a convite da PFDC, na parte da manhã.
3. Na
abertura, a Procuradora Federal dos Direitos do Cidadão reiterou o
objetivo da Audiência, conforme o Edital, qual seja,
“instruir
a sua
atuação e a dos Procuradores e das Procuradoras dos Direitos dos
Cidadãos pela efetivação dos direitos das mulheres, em especial à
não discriminação de gênero e racial, uma
das matérias que elegeu como prioridade
para
os períodos 2008/2010 e 2011/2012, reunindo subsídios de
instituições
públicas, pesquisadores e
organizações da sociedade comprometidas com a promoção de
políticas públicas educativas
e de comunicação social a favor do respeito aos direitos das
mulheres à não discriminação”. As
representações
ao Ministério Público Federal relativas a preconceitos e
discriminação nos meios de comunicação, tomadas em seu conjunto,
reforçam a importância das políticas públicas
de
promoção do respeito ao direito humano à não discriminação,
contrárias aos preconceitos e estigmas, não obstante as ações
protetivas adotadas caso a caso, extrajudiciais e judiciais. No
plano da atuação extrajudicial e da tutela coletiva cabe à PFDC
zelar e contribuir para a efetivação de direitos que dependem da
produção de políticas públicas e ações de implementação
realizadas pelos responsáveis nos entes federativos, sempre com a
participação da comunidade e sob controle social.
Considerando
que um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil
é “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça,
sexo,
cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação” (artigo
3º, § IV da CF); assim como os tratados pertinentes ao tema e a
legislação nacional correlata.
4. Iniciando
a Audiência, a Procuradora Federal dos Direitos do Cidadão
agradeceu a presença de todos, informou que a audiência estava
sendo gravada e veiculada para membros do MPF em todo o Brasil e
convidou a representante do Ministério da Educação,
Sra. Éricka Pisanesch, Diretora de Políticas de Direitos Humanos e
Cidadania para trazer suas considerações sobre o tema “Ações
pela promoção do respeito aos direitos das mulheres à não
discriminação na Educação”.
5.
A Diretora de Políticas de Direitos Humanos e Cidadania, da
Secretaria
de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão, a
SECADI, do
Ministério
da Educação - MEC, cumprimentando a todas/os, agradeceu a
oportunidade, em nome do MEC, de falar sobre as ações pela
promoção do respeito aos direitos das mulheres à não
discriminação na Educação.
A
Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e
Inclusão, a SECADI, no MEC, tem por objetivo
contribuir para a redução das desigualdades educacionais, envidando
esforços para garantir a participação de todos os cidadãos
brasileiros em políticas públicas que assegurem a ampliação do
acesso à educação de qualidade. Nesse sentido, é de nossa
responsabilidade implementar políticas, programas ou as ações que
pautem o respeito aos direitos humanos e a valorização da
diversidade em suas várias formas. Então, o tema aqui é gênero,
relações étnico-raciais e de gênero, mas também faz parte das
politicas e ações dessa secretaria aquilo que envolve a educação
especial inclusiva, a alfabetização de educação de jovens e
adultos, a educação no campo, indígena, relações étnico-raciais,
educação ambiental e educação em direitos humanos. E
entendemos que a questão de gênero tem sim suas particularidades e
ações especificas, mas também é um tema transversal, isto é,
quando falamos em educação inclusiva estamos falando de mulheres
com deficiência, ou no que se desenvolve com relação à educação
indígena e assim por diante. Como
o próprio Plano Nacional de Políticas para as Mulheres (PNPM), o
2º, menciona,“...para garantir que todas as mulheres sejam
respeitadas em seu direito à educação, há que se combater não
apenas a discriminação de gênero, mas todas as outras formas de
discriminação, seja geracional, étnico-racial, por orientação
sexual, pessoas com deficiência, entre outras – que as afetam e
interferem não apenas no acesso, mas também no seu desempenho
escolar.” Este é um ponto, outro ponto é que a gente também vai
conversar um pouco aqui e eu vou destacar nas nossas ações é o
papel fundamental que tem a educação nas mudanças culturais
necessárias para
que a sociedade brasileira seja de fato igualitária.
Eu trago o II Plano nacional de Políticas para as Mulheres porque é
uma de nossas referências na elaboração, na implementação das
ações do MEC, com relação a igualdade de gênero.
Eu
vou destacar por volta de de dez (10) ações. Quatro (4)
relacionadas à dimensão cultural, a educação, por volta de quatro
(4) com relação a escolarização, alfabetização e
profissionalização, e por volta de duas educação para os filhos
que diz respeito, está extremamente vinculado à autonomia das
mulheres. Com
relação à dimensão cultural, o MEC, em parceria com as
Universidades Federais, então, fomenta a educação para a promoção
para a igualdade de gênero, étnico-racial e o reconhecimento da
diversidade sexual, a partir da formação continuada de professores.
O
que se deseja: um professor mais fortalecido para o
enfrentamento
à discriminação na escola, seja ela de gênero, de orientação
sexual ou com relação a raça e etnia.
Os
nossos cursos são na modalidade de extensão, aperfeiçoamento,
especialização, cursos presenciais e a distância. Eu vou destacar
dois principais, um curso denominado Gênero
e Diversidade na Escola – GDE,
que também conta com a parceria da SPM e da SEPPIR, e o outro é o
Gestão
de Políticas Públicas de Gênero e Raça.
São cursos para professores, mas também abrimos um certo
quantitativo de vagas para a demanda social, para conselheiros de
direitos ou para a rede de proteção social. Com relação ao
GPPGER, que é o Gestão de Políticas Públicas em Gênero e Raça,
para que a gente também trabalhe os gestores para a importância
dessa mudança cultural e de que essas questões sejam trabalhadas no
sistema de ensino e cheguem na escola. A nossa grande estratégia,
então, é a formação continuada de professores. De 2008 a
2011
foram por volta de 50.000 vagas, num total de cursos. Esses são
cursos bem específicos, GPPGER, Gestão de Políticas Públicas em
Gênero e Raça, mas temos também outros cursos em que há a
inserção transversal da temática de gênero, nos cursos de
formação, em outros cursos, mas também nos materiais didáticos
que são elaborados. Nos programas de Ações Afirmativas para a
População Negra, o UNIAFRO,
a Educação para as Relações Étnico-raciais, o UNIREL,
ou
mesmo os programas que têm como foco a educação em direitos
Humanos. Quando a gente vai tratar da educação em direitos humanos
a gente está tratando também de toda essa temática.
O
Escola
que Protege
são cursos, são projetos, também em parceria com as universidades
e ele tem como objetivo também, além daquilo que diz respeito ao
ECA, a inserção de outras temáticas, o respeito à diversidade
sexual, a temática de gênero, etc. Então são cursos com um forte
potencial para a promoção dos direitos das mulheres.
No
ano de 20011, uma ação muito importante, foi instituída a Comissão
Interinstitucional para elaborar um texto, que passou por consulta
pública e contou com a contribuição de diversos colaboradores,
sobre as
Diretrizes Nacionais para Educação em Direitos Humanos. Esse
texto foi para consulta pública, deve passar pelo pleno do Conselho
Nacional de Educação – CNE, seguir para homologação do Ministro
e imaginamos que isso deve acontecer no início de 2012. Qual é o
objetivo: orientar o sistema de ensino, uma diretriz nacional para
que a educação em direitos humanos seja incluída no projeto
pedagógico das escolas, para a afirmação de valores, a
solidadriedade, justiça social, participação cidadã, respeito e
valorização da diversidade, equidade com relação a gênero raça
e etnia. Levando para as escolas
uma
cultura de direitos humanos a gente também está trabalhando as
temáticas especificas, de gênero, de raça, das etnias, e é isso
que se pretende com a publicação das diretrizes nacionais; porque
esse é um esforço que envolve Governo Federal, Estados e Municípios
e a gente tem que mudar uma cultura que faz parte se reflete no
sistema de ensino, que faz parte do sistema de ensino. E a escola
certamente tem um forte potencial de criar novos valores. Na escola
se reproduzem valores que vêm da sociedade mas também existe um
potencial muito importante da disseminação e de novos valores.
Com
relação ainda às ações que dizem respeito a trabalhar o elemento
cultural, aquilo que tradicionalmente é transmitido, no Programa
Nacional de Livro Didático, como em
outros programas de aquisição de livros e a distribuição seja
para o estudante, seja para as bibliotecas de escola, seja para o
sistema de ensino, as temáticas de direitos humanos, as temáticas
de igualdade de gênero têm sido inseridas como critérios de
avaliação ou como orientação para que esses temas sejam
contemplados nos editais publicados pelo Ministério da Educação.
Então o O PNLD, Programa Nacional de
Livro Didático, eu
trago aqui como um programa exemplar mas a gente pode também
reconhecer essa iniciativa do MEC nos demais programas de sua
responsabilidade com relação aos livros didáticos. O PNLD visa a
subsidiar o trabalho pedagógico dos professores por meio da
distribuição de coleção de livros didáticos aos estudantes da
educação básica. Então, é feito um edital, feito um processo de
avaliação e seleção dessas obras didáticas, e o que foi
incorporado como critério de avaliação desses livros, no que diz
respeito à temática de gênero, é que se deve considerar a
promoção positiva da imagem da mulher e a não violência. Isso
entra como um dos critérios.
Prêmio
Construindo a Igualdade de Gênero. Vou
falar bem rápido dessa ação mas ela é importante porque o MEC
tem, também em parceria com a Secretaria de Políticas para as
Mulheres, MCT, CNPQ e ONU Mulheres, um prêmio que está na
sua 7ª Edição e que visa construir a igualdade de gênero na
escola. Ou seja, a gente estimula e fortalece a
reflexão pública e a pesquisa acerca das desigualdades de gênero
em nosso pais com um concurso de redação para estudantes de ensino
médio e também seleção de projetos educacionais de ensino médio
- porque também a escola pode ser premiada-, ou mesmo artigos
científicos envolvendo
estudantes do
ensino médio. Os prêmios são importantes porque mobilizam os
estudantes da pós-graduação, os estudantes do ensino médio e as
próprias escolas e sistemas de ensino. Nas últimas edições do
premio nós tivemos 15.000 (quinze mil) inscritos e já estamos na
sétima edição, sete anos.
Como
eu falei, nossas ações se pautam no II PNPM, mas também no
Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos, que é de 2006,
nas deliberações e moções da Conferência Nacional de
Educação, de 2010 , e encontramos no Projeto de Lei nº
8035/10, sobre
o Plano Nacional de
Educação - as nossas
metas de 2011 para 2020 -,
também expresso ali o compromisso do Ministério da
Educação com ações e iniciativas com relação à igualdade de
gênero.
Falei
então que trataria das ações, divididas em quatro eixos: a
dimensão cultural, agora a escolarização, a alfabetização e a
profissionalização. Destacamos, então, o Programa Brasil
Alfabetizado, que tem por
objetivo contribuir para a universalização do ensino
fundamental, promovendo apoio as ações de alfabetização de jovens
com 15 anos ou mais, adultos e idosos nos Estados, no Distrito
Federal e nos Municípios. Como é
que ele funciona: há transferência de recursos financeiros,
em caráter suplementar, aos entes federados que fazem a adesão a
este Programa para desenvolver as ações de alfabetização. De
2008-2011 foram 3 milhões de mulheres atendidas, o
que corresponde a 56% do total de pessoas atendidas no
Programa. Isso vai ao encontro da meta do Plano Nacional de Políticas
para as Mulheres, o que se pretendia atender nesse período era por
volta de três (3) milhões de mulheres. Destaque também para o
Programa Nacional de Inclusão de Jovens,
o Pró-jovem Urbano.
Qual é o objetivo desse programa:
elevar a escolaridade
visando à conclusão do ensino fundamental/EJA, integrado com
qualificação profissional inicial e com o desenvolvimento de ações
comunitárias, com exercício de cidadania, em forma de curso. Um
curso que dura 18 meses. O programa atende então jovens de 18 a 29
anos, que saibam ler e escrever, então não são os não
alfabetizados, são os que já sabem ler e escrever, 18 a 29 anos, e
não têm o ensino fundamental completo. Até 2010 uma média de 66%
do público atendido pelo Pro-jovem foi de mulheres. Também o
Pró-jovem Campo, ou
denominado Programa
Saberes da Terra, que
visa a fortalecer e ampliar o acesso e a permanência de jovens
agricultores familiares no sistema formal de ensino. É também
desenvolvido em parceria com os estados e municípios e de 2008 a
2011 estão em processo de escolarização 3 mil mulheres. No Plano
Nacional de Políticas para as Mulheres existe essa prioridade:
“ampliar o acesso e a a permanência na educação de grupos
específicos de mulheres com baixa escolaridade”. Por
fim, nesse eixo, o Programa
Mulheres Mil,
que tem por objetivo a profissionalização de mulheres em situação
de vulnerabilidade social; acesso à educação profissional, emprego
e renda. O Mulheres
Mil
entra no programa Brasil
Sem Miséria,
articulado então com a meta de erradicação da pobreza extrema, do
governo federal. São projetos locais ordenados de acordo com as
necessidades de profissionalização da comunidade, segundo a vocação
econômica regional. Também utilizamos a Rede
de Institutos Federais de Ensino Profissional e Tecnológico.
De
2008-2010
foram 1.200
mulheres, porque foi um projeto piloto. E a partir então de 2011
ele passa a ter uma abrangência nacional, estimativa de atender 10
mil mulheres, com cursos, como já falei, determinados pela demanda
social e com a formação continuada de educadores. É uma proposta
para 2012, que aqueles cursos de formação continuada, que eu disse
lá no início, também sejam ofertados para aqueles que fazem parte
da equipe do Programa Mulheres Mil.
Por
fim, achei importante também trazer aqui, para essa discussão, a
principal ou as principais ações relacionadas à educação
para os filhos,
porque esta é uma demanda bastante importante que diz respeito à
autonomia das mulheres para
a inserção no mercado de trabalho, por isso que eu trago essas duas
ações. O carro-chefe é o
Pró-infância, que é o Programa Nacional de Reestruturação e
Aquisição de Equipamentos para a Rede Escolar Pública de Educação
Infantil , que
tem por objetivo ampliar
então o acesso à educação infantil. Nós
vamos ter aqui o IBGE que certamente vai trazer os dados e também o
INEP, mas na PNAD de 2009 temos o dado de que 18,4%
das crianças de 0 a 3 anos tinham acesso a creches e 81,3% a
pré-escola.
Então,
o que o Pró-infância objetiva:
criar condições, junto ou em parceria com os municípios, para
ampliar o acesso à educação infantil. A caracterização do
pró-infância: a transferência de recursos para os municípios e o
Distrito Federal para financiar a construção de unidades escolares
infantis e quadras poliesportivas. De 2007 a 2011, já
tivemos convênios firmados com municípios para construção de
2.528 unidades escolares. E de 2011
a 2014 a meta é a construção de 6.000 creches. Essa também é uma
ação prioritária do Governo Federal, foi inserida no Plano de
Aceleração do Crescimento II, o PAC II, e, associada a ela, é
importante mencionar, existem investimentos também crescentes, ao se
aumentar o número de unidades a gente também aumenta os recursos
para a manutenção dessas unidades. O Pró-infância corresponde ao
Decreto nº 533, de 2011, que prevê já a transferência de recursos
para os municípios, para que essas creches, assim que estejam
prontas e em funcionamento, já recebam recursos para custeio. Na
verdade é assim, a creche pode estar pronta e até que seja
registrada a matrícula dessas crianças no censo escolar a gente
teria um tempo de defasagem para que os municípios recebessem os
recursos do FUNDEB. Então o decreto
533 vem
prover recursos direto para as unidades de ensino, até que elas
sejam incluídas no censo escolar e ai então recebam os recursos do
FUNDEB, que são recursos para custeio, para manutenção dessas
creches. Além disso, não podemos esquecer que o PDDE também
investe recursos direto para as unidades de ensino, e que também vai
haver um acréscimo desses recursos, acompanhando as 6 mil unidades
que serão instaladas. E,também, o Programa
Nacional de Alimentação Escolar.
Lembrando que no PNE - a proposta do PL 8035/10-,
temos
uma meta: universalização do atendimento escolar da população de
4 e 5 anos 11 meses, até 2011, e ampliar a oferta de educação
infantil de forma a atender a 50% da população até 3 anos, até
2020.
Porque o destaque? Porque mais uma vez o MEC reafirmando seu
compromisso com a universalização da educação infantil, daquela
forma: até 2011 a universalização de 4 a 6 anos, a pré-escola e
50%
até 2020, faixa etária de 0 a 3 anos.
Muito obrigada,
Dra Gilda, pela oportunidade e estou aqui para os debates
posteriores.
6.
Perguntas:
1ª.
Procuradora Federal dos Direitos do Cidadão, Dra Gilda Carvalho: A
gente vê os planos, programas e as ações que são produzidas ao
nível do MEC como politicas para as mulheres muito bem expostos na
apresentação. Gostaria de saber saber sobre o monitoramento dessas
ações e programas.
2ª.
Procuradora de Justiça do Estado de Pernambuco, Dra. Maria
Bernadete M. de Azevedo Figueiroa - Procuradora de Justiça –
MPE/PE. Coordenadora
do GT – Racismo.
Cumprimento
a todos/as presentes e a professora Éricka pela sua exposição e
informações importantes para todas/os. Mas no meu Estado,
Pernambuco, como Procuradora de Justiça eu coordeno o GT de Combate
ao Racismo, desde 2002, e a nossa meta prioritária, que foi colocada
pelo movimento social negro de Pernambuco, é a implementação da
lei 10.689, que cuida da educação para as relações
étnico-raciais, e a grande demanda dos municípios, quando os
promotores procuram os gestores municipais para implementar a lei, é
justamente a ausência das secretarias de educação, de uma política
estadual voltada para a implementação da lei, e a dificuldade
de capacitação dos professores; porque a gente propõe nos termos
de ajustamento de conduta que os gestores municipais capacitem os
professores, propõe prazos etc. Nós temos articulado muito com as
universidades em Pernambuco e temos percebido que não há uma
articulação para formação inicial do professor e nem formação
continuada. Pelo menos nas faculdades públicas. Em Pernambuco, pelo
menos, não existe. Apenas na Universidade Rural tem um Grupo de
Estudos Afro-brasileiros, que agora começou a fazer um trabalho por
um esforço, digamos assim, imenso de um grupo restrito de
professores, que está à frente do NEAB. Não existe uma política
institucional nas Universidades Públicas e muito menos nas
particulares de formação inicial e continuada. A senhora falou de
parceria com as universidades em formação continuada. Então eu
queria saber como se dá essa parceria, porque lá em Pernambuco não
me consta. É somente para que a gente possa chegar lá com algumas
informações, que talvez a gente não tenha. Porque formação
inicial eu sei que existe, agora a senhora falou que existe a
continuada.
7.
Respostas: Sra Éricka Pisanesch - MEC.
1ª.
O monitoramento.
Dra
Gilda, quanto às metas no Plano Nacional de Políticas para as
Mulheres, é feito o monitoramento pela própria Secretaria de
Políticas para as Mulheres, e com relação àquelas aquelas ações
do MEC que dizem respeito a essas metas, nós fazemos o monitoramento
por meio da Diretoria de Educação em Direitos Humanos e Cidadania,
a Coordenação de Direitos Humanos, e prestamos conta, fazemos o
acompanhamento sobre essas metas. Porque eu falei de diversas ações,
certamente aquelas ações que dizem respeito às metas do governo
que estão estão nos Planos como o de Erradicação da Miséria ou o
PAC, são metas sempre acompanhadas pelo Ministério da Educação,
mas também metas que deverão ou são
acompanhadas
em parceria com outros Ministérios, ou mesmo, no PAC, temos grupos
coordenados pela Casa Civil. Então, o Governo Federal monitora
naquilo que diz respeito a suas metas. Agora, é sempre importante
reafirmar que temos um sistema de ensino e tudo é feito em parceria.
Quer dizer, se temos a meta do Pró-infância, a participação dos
municípios é fundamental, porque o Governo Federal pode criar todas
as condições e a gente tem que estar ali num trabalho muito corpo
a corpo com os municípios, de suporte, e com a adesão também dos
municípios, para que essas ações se concretizem e se realizem lá
na ponta. De uma maneira geral, é isso para todas as nossas ações.
2ª.
Com relação à formação
continuada,
que é a pergunta da Procuradora Bernadete, os cursos de formação
continuada, da Rede Diversidade, como nós nomeamos, da SECADI, eles
eram ofertados por meio de editais públicos, resoluções e editais
via FNDE, em que as Universidades se credenciavam e faziam, então,
a oferta. Nós vamos ter mudanças a partir do ano que vem, isso está
sendo revisto no MEC, a rede de formação para os professores. A
gente vai passar a ter um fluxo de demanda vindo da escola, passando
por uma discussão local com as Universidades, dai, então, uma
negociação com as universidades daqueles cursos que serão
ofertados, e isso é uma mudança bastante importante, porque você
traz então os sistemas de ensino e a própria escola no engajamento
daquilo que é a demanda local, na identificação daquilo que é
necessário levar para a formação do professor, que o sistema de
ensino está necessitando, então o fluxo sera invertido. Não só
uma proposição do MEC e da Universidade que tinha cursos que eram
ofertados, mas sim, agora, uma demanda identificada das escolas e dos
sistemas de ensino e as universidade se adequando a essas demandas e
o MEC, por sua vez, fomentando para que esses cursos ocorram. Então,
a partir de meados do próximo ano, vai ser publicado um catálogo de
cursos, que é a possibilidade, e todo esse fluxo construído,
certamente divulgado, trabalhado junto ao sistema de ensino para ser
detectada, então, a demanda, e a realização dos cursos de formação
continuada.
8.
Comentários dos participantes:
1º.
Frei David, Coordenador da Rede Educafro:
Somos
coordenadores de uma rede de pré-vestibular para negros chamada
Educafro, que está em vários lugares do Brasil. Parabenizar
então
o MEC por essa exposição, eu estava ouvindo as explanações, mas
também dizer da importância da Procuradoria Federal dos Direitos
dos Cidadãos em organizar esse seminário, que para nós é um
problema urgente e necessário. Eu tenho certeza que a nossa
procuradora Gilda vai também ter como desafio, no coração dela,
colocar na instituição a missão de discutir também cota para
negros, para procurador, porque, com alegria, sabemos que a
Procuradoria do Estado do Rio de Janeiro já adotou cota para negros,
no próximo concurso para procurador. Foi uma luta suada, várias
reuniões, mas conseguimos essa vitoria no Rio de Janeiro. E dizer,
com certa
tristeza,
partilhar com vocês, estamos chegando agora do Senado, eu e vários
militantes que estão aqui, onde, infelizmente, de maneira violenta,
com muitas tensões e muitos choques, o Senado mais uma vez mandou
botar na gaveta o projeto de cotas para as universidades federais. Eu
deixo com a procuradora um resumo do que aconteceu no Senado hoje, se
a senhora quiser pode mandar tirar copia para todo mundo, e concluo
dizendo que o Brasil vive um momento especial. Primeiro já são 184
universidades públicas que adotam cotas para negros, branco pobre e
indígenas, especialmente porque essas universidades decidiram
enfrentar uma coisa que no Brasil é muito mal compreendida na minha
opinião, que é a meritocracia. E agora, para minha surpresa, a
defesa nossa da meritocracia, defesa nossa de 1999, e fomos
rejeitados e humilhados em nossa defesa, apareceu agora um livro de
um professor de Harward, que ele acaba de lançar, discutindo
meritocracia moral e meritocracia imoral. Ele defende que a maioria
das universidades do mundo praticam a meritocracia imoral. Eu
recomendo esse livro pra todo mundo, o nome dele é Michael Sandel, o
titulo é Justiça, e eu vou, então, deixar com a senhora a copia do
relatório e acho importante que todos tenham copia também do que
aconteceu lá no Senado hoje.
9. A
Procuradora Federal dos Direitos do Cidadão, Dra Gilda Carvalho,
agradece
a participação da representante do MEC e dos demais, informando que
o documento apresentado por Frei David será reproduzido para os
presentes. Indaga se a Diretora Éricka
gostaria de fazer esclarecimentos ou comentários adicionais e dá
início à exposição seguinte, convidando à Mesa a Relatora
Nacional da Plataforma DHESCA Brasil para o Direito Humano à
Educação, Denise Carreira.
10. Exposição:
Gênero, Racismo e Educação no Brasil. Denise Carreira – Relatora
Nacional para o Direito Humano à Educação – Plataforma DHESCA
Brasil. A Relatora
parabeniza a iniciativa da PFDC, da Dra Gilda Carvalho, “uma
inciativa tão importante para nossa democracia”. Agradece também
a parceria da PFDC com a Relatoria Nacional de Educação e reforçar
a expectativa que deste encontro
possam surgir propostas
concretas que permitam o avanço da agenda de gênero e raça no
Estado brasileiro.
Eu
vou falar um pouco sobre as questões de gênero e raça na educação.
Em primeiro lugar, trazer para vocês o que são as Relatorias
Nacionais de Direitos Humanos1.
Então em 2002, inspirado pela experiência dos Relatores Especiais
da ONU, o Brasil foi o primeiro pais a criar Relatores Nacionais de
Direitos Humanos, com apoio também de agências da ONU no Brasil. A
iniciativa se deve a uma articulação de sociedade civil chamada
Plataforma DHESCA Brasil e essas relatorias contam com o apoio formal
da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão. Nós somos
atualmente cinco Relatores Nacionais e eu respondo pela área de
educação, nós temos também de saúde, alimentação e
território, meio ambiente e direito às cidades. Nós seguimos a
metodologia dos relatores especiais da ONU, produzindo relatórios e
investigações independentes sobre violações dos direitos humanos
no Brasil, em cada uma dessas áreas. Os relatores são eleitos por
meio de edital público para um mandato de dois anos. E a partir da
experiência brasileira, é importante colocar, já foram criadas
outras relatorias nacionais, em países sobretudo da Ásia.
A
Relatoria da Educação no momento está concluindo um relatório
sobre educação e racismo no Brasil, do qual fizeram parte missões
a sete estados brasileiros sobre intolerância religiosa nas escolas
públicas, principalmente contra adeptos de religiões de matriz
africana; educação quilombola, que nós estamos concluindo e
racismo no cotidiano escolar. Nós já realizamos no passado outras
missões ligadas a educação no sistema prisional brasileiro,
educação e violência armada, educação indígena e também
concluímos um Informe chamado Gênero e Educação no Brasil que
também vamos abordar rapidamente aqui..
Bases
da Apresentação
- Quais são as
bases para essa rápida apresentação
que
a gente vai trazer para vocês e para a procuradora Federal dos
Direitos do Cidadão, as bases da nossa apresentação aqui,
quais são os documentos de nossa referência: a) o nosso Informe
preliminar e o Relatório, que já falei para vocês, que nós
estamos concluindo, sobre educação e racismo; b) o Informe Gênero
e Educação, que concluímos em outubro desse ano e que foi
apresentado à Comissão Interamericana da OEA, em Washington; c) a
apresentação também que a relatoria fez em audiência pública no
STF sobre a importância das ações afirmativas no ensino superior e
d) ações, pesquisas e materiais que nós estamos produzindo como
parte, que eu também sou coordenadora de educação uma organização
chamada Ação Educativa, que tem todo um um trabalho no campo de
educação e relações raciais, e nesse trabalho se destaca uma
publicação chamada Indicadores
Escolares de Qualidade Educacional, com foco nas relações raciais,
um material que nós estamos agora fazendo a testagem final para
divulgação mais ampla.2
Desafios brasileiros.
Resumindo
aqui o diagnóstico, quais são os principais desafios que nós
chamamos a atenção tanto no Informe
Gênero e Educação
quanto nos outros relatórios que abordam as questões ligadas ao
racismo, quais são os desafios que a gente destaca:
- as desigualdades persistentes entre as mulheres brasileiras na educação. Então nós tivemos sim avanços nos indicadores de acesso e desempenho, mas marcados sempre por desigualdades entre mulheres de acordo com a renda, raça e etnia e local de moradia (rural e urbano), com destaque para a situação das mulheres negras e indígenas;
- a situação de pior desempenho e de maiores obstáculos para permanência na escola por parte dos meninos brasileiros, em especial, dos meninos e jovens negros, entendendo também como parte da problemática de gênero e raça no Brasil;
- a manutenção de uma educação sexista, racista, homofóbica e discriminatória no ambiente escolar;
- a concentração das mulheres em cursos e carreiras “ditas femininas”, com destaque para a situação das mulheres negras em carreiras menos valorizadas socialmente;
- a baixa valorização das profissionais de educação básica, categoria que é constituída quase em 90% por mulheres, e podemos aqui afirmar também, levando em conta nossas experiências tanto na Relatoria quanto na ação educativa, que quanto mais negra e pobre é a comunidade, mais precárias são as condições de trabalho das profissionais de educação;
- e o acesso desigual à educação infantil de qualidade, que também já foi abordado aqui pela diretora Éricka.
Racismo.
Eu faria uma fala sobre a discussão do racismo só destacando aqui
que as
as
políticas universais de educação, elas têm sido insuficientes
para enfrentar as desigualdades raciais que marcam historicamente a
educação brasileira, tanto no que se refere ao acesso, quanto à
permanência e à aprendizagem. Aqui a gente chama a atenção que é
importante que haja uma combinação de políticas universais com
políticas de ação afirmativa e também aqui a constatação que os
dados escancaram que o argumento da pobreza é insuficiente para
explicar todas as nossas desigualdades e que o país não pode mais
perder tempo para enfrentar aquele que é um dos seus grandes
desafios que é a problemática racial dentro da nossa democracia.
Recomendações.
Eu vou jogar mais o meu tempo aqui nas recomendações, porque eu
creio que este é um ponto fundamental para a gente construir junto
com a Procuradora uma agenda, então eu vou trazer
as
recomendações que a relatoria vem fazendo com relação a esses
desafios, a essas problemáticas. E depois concluo com um conjunto de
recomendações à PFDC.
Com
relação às recomendações que a relatoria traz e que já foram
parcialmente apresentadas ao Congresso Nacional, que em fevereiro do
ano que vem vão voltar a ser apresentadas no Congresso nacional e ao
Conselho Federal da Educação.
A
primeira recomendação: o
desafio de aprofundar
a visibilidade e a compreensão das desigualdades de gênero na
educação (desagregar, cruzar e analisar). Aqui
a gente traz a importância que os órgãos oficiais de pesquisa, em
especial, a gente chama a atenção do INEP e do IBGE, avancem
com relação às possibilidades de desagregação, cruzamento e
análise de informações educacionais por sexo, raça, renda,
campo/cidade, regionalidade, entre outros, por nível e por etapa
educacional, a serem analisadas e disponibilizadas para a opinião
pública. Aqui a gente saúda a criação
do Observatório de Igualdade de Gênero e da série Retratos das
Desigualdades de Gênero e Raça, pela Secretaria de Políticas Para
Mulheres, Unifem e Ipea,
mas coloca a importância
de que o Observatório consiga divulgar dados anualmente, porque os
últimos dados que nós
tivemos acesso, e entramos em contato também com a Secretaria de
Políticas para as Mulheres, são dados de 2008. Então a importância
de que a gente tenha a divulgação de informações tratadas,
analisadas anualmente. Aqui também a gente destaca a importância de
qualificar
o preenchimento do quesito cor/raça e de outros quesitos por parte
das escolas no Censo Escolar (entre eles, a gente destaca aqui o nome
social de estudantes travestis e transgêneros),
por
meio de processos de formação continuada para agentes que atuam nas
secretariais escolares. E também a gente coloca aqui a importância
de que seja feito um censo específico sobre estudantes travestis e
transgêneros no país, porque não existe informação sobre isso.
A
segunda recomendação: quebrar
as barreiras enfrentadas pelas Mulheres e meninas negras e ampliar
as Ações Afirmativas na Educação, como o Frei David já colocou
aqui. Aqui a gente destaca que
apesar do grande investimento feito pelas meninas e mulheres
negras na educação, permanecem profundas desigualdades entre as
mulheres negras e brancas e entre mulheres negras e homens brancos
decorrentes da articulação do sexismo e do racismo. O mesmo também
a gente deve falar com relação às mulheres indígenas. E aqui a
gente traz que a desqualificação
cotidiana da beleza negra, a erotização precoce, a falta de
imagens e de referências positivas e empoderadas, além das
dificuldades enfrentadas por grande parte delas no cotidiano
familiar, contribuem para esse quadro. E aqui a gente destaca as
barreiras enfrentadas pelas jovens negras na passagem entre o ensino
médio e o ensino superior, momento em que acontece uma inversão:
apesar da maior presença e do melhor desempenho das mulheres negras
até o ensino médio, no ensino superior os homens negros estão
mais presentes no ensino superior. E aqui a gente faz a defesa
intransigente, que nós fizemos também no STF, da importância das
Ações Afirmativas no Ensino Superior e na Educação Profissional
também, com recortes de raça e renda, com metas que contemplem as
mulheres negras e indígenas.
A
terceira recomendação: Melhorar a situação educacional dos
meninos e jovens negros e implementar o Plano Nacional da lei
10.639/2003,
que a procuradora Bernadete também já trouxe aqui. Então a gente
traz a informação que os
meninos negros estão entre aqueles com pior desempenho e menor
escolaridade entre os grupos sociais. Associado às questões
colocadas no item anterior referentes às meninas e mulheres negras,
os meninos negros enfrentam um modelo de escola que valoriza a
obediência, que silencia diante do racismo cotidiano e que não
aponta perspectivas positivas de futuro. E aqui a gente destaca que o
racismo na escola se concretiza por meio não só de atitudes ativas
(agressões, humilhações, apelidos, violências
físicas), mas de forma mais “sutil” por meio da falta de
reconhecimento e de estímulo, da negação de uma história de
resistência do povo negro no Brasil e de suas identidades, da
desatenção, do isolamento, da distribuição desigual de afeto e da
baixa expectativa positiva por parte dos(das) profissionais de
educação com relação ao desempenho de crianças, jovens e adultos
negros. A gente também aqui traz que o baixo desempenho dos meninos
e jovens negros também deve ser lido na chave como uma “forma de
resistência” dos jovens ao modelo de escola constituído.
Colocamos também que as políticas de avaliação e de promoção da
aprendizagem ainda pouco refletem as desigualdades de gênero e raça
como questões estruturantes do desafio educacional brasileiro. E
reforçamos aqui a importância do Plano Nacional, da da lei
10.639/2003, lançado em maio de 2009 e que enfrenta de forma muito
concreta os vários desafios ligados à implementação dessa lei
pelos sistemas de ensino.
O quarto ponto é ampliar o
acesso à Educação Infantil de qualidade, esse
acesso que é marcado profundamente por desigualdades de gênero e
raça. Também já foi abordado aqui por Éricka, mas aqui também
nós destacamos a importância da educação infantil, para as
famílias e, em especial, para as mulheres, na perspectiva de
fortalecimento de sua autonomia. Ainda as mulheres hoje são
responsáveis predominantemente pelo cuidado com as crianças,
realidade que também a gente quer e precisa mudar.
Quinta recomendação é a
construção de uma política de EJA (Educação de Jovens e Adultos)
com enfoques de gênero e raça/etnia.
E aqui nós trazemos alguns números: que proporção de pessoas não
alfabetizadas é maior entre as mulheres do que entre os homens em
grupos com idade superior a 39 anos, ou seja, as mulheres não
alfabetizadas estão concentradas nas faixas etárias mais elevadas.
Com relação ao analfabetismo funcional, os homens constituem a
maioria. Os indicadores disponíveis explicitam a presença
majoritária da população negra entre os não alfabetizados (dos 14
milhões, 9 milhões de negros), com destaque para a situação das
mulheres negras. Excetuando a região sul, todas as demais
regiões predominam pessoas não alfabetizadas negras, e desse número
os 6,8 milhões de pessoas não alfabetizadas que frequentam a EJA,
entre 209-2010, 71,6% são negros. Nós temos aqui outras
informações sobre dados, eu vou passar, mas destacar que já
consta no diagnóstico e no marco normativo da EJA as questões de
raça e gênero, mas no desenho das políticas não são ainda
consideradas, elas permanecem ainda muito no plano do diagnóstico.
Então é importante a gente dar um passo no sentido de que essas
questões impactem o processo de formulação e implementação das
políticas de EJA. E aqui também a gente chama a atenção para a
importância da garantia do direito à educação de mulheres no
sistema prisional, que é uma agenda também vinculada à educação
de jovens e adultos..
A sexta recomendação é
implementar o Piso Salarial Profissional Nacional
das(dos) Profissionais de Educação e melhorar as condições de
trabalho nas escolas e creches. Essa aqui eu só vou passar, não vou
detalhar.
Sétima.
A
garantia de conteúdos referentes a relações sociais de gênero,
raça e sexualidade na Formação inicial e continuada das(dos)
profissionais de educação.
E aqui a gente também coloca um detalhamento dessa recomendação
que também já foi abordada aqui pela procuradora Bernadete. dos
Profissionais de Educação, em elaboração
pelo Conselho Nacional de
Educação Básica, da Capes.
Oitava.
Esse é um
ponto que eu gostaria de chamar a atenção, essa recomendação:
Respeitar o princípio da laicidade,
acabar com
o ensino religioso confessional em escolas públicas,
com a compra de livros de ensino religioso pelas redes públicas de
ensino e revisar a legislação existente sobre o ensino religioso
no Brasil. Então esse é um ponto bastante importante, nós da
Relatoria estamos vindo de uma missão de intolerância religiosa, e
nós observamos que muitas vezes o ensino religioso está sendo
usado como espaço de proselitismos religiosos, está sendo usado
para barrar a implementação da Lei 10.639 e de programas
comprometidos com educação em sexualidade. Então é necessário
afirmar a importância da laicidade, defender essa laicidade, e que
o ensino religioso seja realizado nos espaços religiosos e por
opção da família, e não por escolas públicas. E aqui a gente
reforça a importância da Ação Direta de Inconstitucionalidade
(ADI), que está hoje no STF, que tem como objeto o ensino
religioso confessional no estado do Rio de Janeiro e da Bahia e o
acordo Brasil-Santa Sé, que também reforça a agenda do ensino
religiosos cristão nas Escola Públicas brasileiras.3
A nona recomendação é
promover uma política nacional de educação em sexualidade,
implementando a Declaração da Cidade do México4,
essa declaração interministerial da qual o Brasil é signatário,
suspendendo o veto ao kit Escola sem Homofobia e
elaborando as Diretrizes Nacionais Curriculares sobre
Educação, Gênero e Sexualidade, não só para educação básica
mas para o ensino superior.
Décima. Promover
ações de estímulo a maior entrada das mulheres nas áreas das
ciências e dos homens em áreas sociais e do cuidado.
A décima primeira
recomendação. Criar
protocolo nacional de
atendimento de casos de
racismo, sexismo, homofobia/lesbofobia, intolerância religiosa e
outras discriminações no ambiente escolar e fortalecimento da
escola na rede de proteção de direitos das crianças e
adolescentes.
A décima segunda
recomendação, é a definição de uma meta de equalização que
a relatoria propôs ao Congresso nacional por meio da campanha
nacional pelo direito à educação, a definição de uma meta de
equalização e de outras metas de promoção da equidade e
enfrentamento das discriminações no Plano Nacional de Educação -
PNE,
com financiamento adequado e gestão democrática escolar fortalecida
com base em uma concepção mais plural de família. Aqui a gente
destaca que a gestão democrática ainda esta referenciada num modelo
de família tradicional nuclear, e esse modelo de família muitas
vezes utilizado para discriminar outros modelos familiares,
principalmente de famílias negras e pobres. Então nós entendemos
aqui que é necessário que a gestão democrática escolar possa
rever, revisitar sua concepção de família numa perspectiva mais
plural.
Recomendações à PFDC.
Agora, rapidamente, as recomendações à PFDC. São sugestões, eu
não sei se os verbos, pois eu utilizei alguns verbos aqui, são os
mais corretos, mas eu trago aqui para apreciação. Então, à
Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, a partir dessas
questões que a gente trouxe aqui.
- Solicitar ao INEP/IBGE/IPEA apresentem anualmente análises de dados sobre desigualdades de gênero e raça por nível e modalidade da educação e por região/estado; naquela perspectiva da gente conseguir visibilizar melhor e compreender melhor as dinâmicas de reprodução, transformação e acirramento das desigualdades na educação.
- Solicitar informações ao governo brasileiro – MEC, Ministério de Relações Internacionais, Secretaria Nacional de Direitos Humanos - com relação ao cumprimento da Declaração da Cidade do México – Educar para prevenir (2008), da qual o país é signatário, sobre políticas de educação em sexualidade. Essa declaração é um documento fundamental e entendemos que várias iniciativas entre elas o Kit Escolas sem Homofobia se vinculam ao que está previsto na declaração.
- Solicitar ao MEC balanço sobre a implementação do Plano Nacional da lei 10.639, lançado em 2009, e informações sobre o que está sendo feito para enfrentar a maior exclusão de meninos e meninas negras da escola;
- Retomar à solicitação para que os Ministérios Públicos Estaduais e os Federais monitorem a implementação la lei 10.639/2003 com base em indicadores a partir do Plano Nacional, da lei 10.639 e de indicadores escolares de implementação. Este é um ponto que a Procuradoria já teve um papel fundamental provocando os Estados a solicitar informações aos sistemas sobre a implementação da lei; nós estamos propondo que a Procuradoria faça uma outra provocação, mas tendo como base indicadores mais precisos sobre o que significa implementar a lei 10.639, para que vários sistemas não respondam somente com algumas palestras ou alguma ação no 20 de novembro que isso é implementar a lei 10.639.
- Sugerir ao STF a convocação de um ciclo de audiências públicas para apreciação da ADIN referente ao ensino religioso e ao Acordo Brasil-Santa Sé. Então nós colocamos a importância da Procuradoria sugerir ao STF que seja convocado de um ciclo de audiências públicas, como foi feito com relação às ações afirmativas no ensino superior. Ações afirmativas que foram feitas para qualificar o debate brasileiro sobre um tema tão estratégico.
- Reforçar junto às comissões de educação da Câmara e do Senado Federal a importância das metas de equalização e de promoção de equidade no novo Plano Nacional da Educação - PNE;
- Manifestar junto ao STF, ao MEC, ao Conselho Nacional de Educação - CNE e ao Congresso Nacional a importância das ações afirmativas na educação com recorte de raça e gênero;
- Estimular o CNE e o Conanda a desenvolverem proposta de protocolo escolar de registro e encaminhamento de casos de discriminação, em diálogo com o Conselho Nacional dos Direitos da Mulher (CNDM) e o Conselho Nacional dos Direitos da População Negra (CNDPN);
- Estimular os Ministérios Públicos Estaduais a atuarem pela criação de comissões de intolerância religiosa nos estados, de forma articulada com instancias do poder publico e organizações da sociedade civil;
- Estimular o Ministério Público Federal e os Ministérios Públicos Estaduais a monitorarem a implementação da educação em territórios quilombolas, a partir de indicadores definidos com base nas Diretrizes Nacionais de Educação Quilombola (que estão sendo agora apreciadas) e recomendações do relatório Educação e Racismo no Brasil (desta Relatoria).
São estas as sugestões mais concretas à PFDC.
Muito obrigada pela oportunidade e parabéns pela iniciativa.
11. Dra. Gilda Carvalho
agradece a Relatora da Plataforma DHESCA, observa que são muitas
recomendações, sobre as quais ela deverá se concentrar, propondo
continuarem a interlocução para ver qual a forma mais viável e
expedita de dar os encaminhamentos.
12.
Perguntas e Respostas
1ª.
Wilson Waleci. Assessoria PFDC.
Gostaria
de saber se existem dados que analisam o conteúdo dos livros
didáticos, na questão de discriminação de gênero e raça.
Resposta
à 1ª pergunta:
Obrigada,
Wilson, pela questão. Existem várias pesquisas desenvolvidas por
universidades e organizações não governamentais que abordam a
questão, e que trazem que houve sim, como a Diretora Éricka já
apontou, avanços importantes com relação à definição de
critérios para análise dos livros didáticos no Programa Nacional
dos Livros Didáticos, então houve avanços. Mas as pesquisas também
apontam que ainda persiste uma abordagem com problemas graves de
discriminação racial e de gênero, de forma menos explícita, mas
mais sutil. Então do ponto de vista das imagens, tem um estudo da
Universidade Federal de São Carlos que analisa as imagens dos livros
didáticos, que coloca como a população negra ainda é colocada
como figurante, num papel secundário, você tem um lugar das
religiões de matriz
africana também desvalorizado, você tem pouca valorização dessa
memória, dessa história de resistência nos livros didáticos.
Então já se avançou, mas precisa avançar mais, principalmente
para captar essa discriminação mais sutil da negação, da
invisibilidade, de colocar a população negra num papel secundário.
Então é isso que eu poderia trazer para você, que se avançou mas
persistem muitos desafios
nesse campo, e que por isso o Plano Nacional da lei 10.639/2003
coloca a importância de se aprimorar esses indicadores com relação
à análise dos livros didáticos, do que é considerado avanço, ou
seja que essa comissão que faz a análise dos livros didáticos
possa contar com especialistas no campo das relações raciais e de
gênero para aprimorar essa análise, principalmente nesses aspectos
mais sutis. Avançamos, mas muito desafios persistem.
2ª.
Dra Gilda Carvalho. PFDC. Eu
queria aproveitar essa pergunta do Wilson, muito importante, porque a
gente se depara com esse problema na PFDC. Nós desenvolvemos desde
2009 um trabalho, expedimos ofícios circulares aos procuradores dos
direitos do cidadão, para que eles vissem no Estado ou nos seus
Municípios a implementação dessa lei. E eles pediram que houvesse
comprovação por parte daquela autoridade, seja municipal, estadual
ou federal, que mandassem ao ministério público o currículo. Só
que temos pilhas de remessas de currículos, mas nós não somos
especialistas para saber se os currículos se adequam às diretrizes
voltadas para a implementação da lei. Então foi feito ofício ao
setor do MEC que cuida dessa parte, solicitando um exame, ao menos
algumas análises. Depois eu soube, há pouco tempo, que eles
disseram que não podiam fazer, porque não tinham contingente humano
hábil para fazer.. Então eu fiquei tão frustrada, que eu talvez
tenha que fazer um contato novamente, talvez tenha sido vencida essa
dificuldade, porque eu estou novamente com uma pilha de procedimentos
que vieram dos Estados com igual problema: quem é que vai dizer se
aquele currículo se adequa ou não. Não sei Denise, talvez você
possa nos ajudar a encontrar um caminho, uma forma prática e rápida
de resolver isto, e se você já tiver agora uma sugestão todos
gostaríamos de ouvir suas palavras.
Resposta
à 2ª Pergunta.
Acho
que um caminho, até provocando também a Éricka, seria a
constituição de uma Comissão para analisar esse material que
chegou na PFDC. Nós da Relatoria Nacional da Educação estamos à
disposição para integrar esta Comissão, de análise desse
material, que é bastante precioso para a análise do momento de
implementação da lei no país. Então eu gostaria de colocar a
Relatoria à disposição para contribuir nessa análise e também
gostaria de dar um depoimento da importância dessa iniciativa nos
Estados. Nós vimos o que resultou essa iniciativa, que foi de uma
articulação do ex-ouvidor da SEPPIR, o professor Adami, com a PFDC,
gerou uma movimentação nos Estados muito importante, muitas escolas
passaram a se preocupar com a lei a partir da provocação que
receberam, então impulsionou sim uma agenda. Então nós entendemos
que seria muito importante que essa provocação fosse feita de
tempos em tempos, para alimentar esse processo de estímulo à
concretização dessa agenda, uma agenda que nós sabemos enfrenta
diversas resistência no país, especialmente nos sistemas
educacionais e no mundo escolar. Então esse tipo de estímulo é
importante, e o que resulta também, os materiais também permitem
que a gente tenha esse quadro. Para concluir dizer que acho
importante, como a gente sugere aqui, que a próxima ação nesse
sentido pudesse sugerir aos estados um conjunto de indicadores para
que os sistemas reagissem a partir deles. Porque nós vimos alguns
materiais que o Estado de São Paulo enviou, e haviam essas
informações; fizemos tantas palestras, ou seja é uma coisa muito
solta e fragmentada, e o que o Plano Nacional da 10.639 sugere é uma
abordagem mais sistêmica, mais mais integral nesse desafio que é
a implantação de uma lei tão estratégica para o nosso país.
Obrigada.
13.
A Procuradora Federal dos Direitos do Cidadão
agradece novamente a Relatora e convida a próxima palestrante, a
professora Maria Luiza Júnior, do Movimento Negro Unificado.
14. Exposição:
Imagens das mulheres nos meios de comunicação e as demandas por
reconhecimento e respeito – Sra. Maria Luiza Júnior – Movimento
Negro Unificado.
Boa
tarde, eu quero agradecer o convite, porque é muito importante para
o Movimento Negro estar inserido nessa promoção de igualdade,
principalmente o segmento feminino, muitas mulheres negras são mães
de filhos formados nessa sociedade racista.
Bem
o disse a saudosa Lélia Gonzáles – fundadora do MNU – que
“sexismo e racismo caminham par a par na sociedade brasileira”.
Ainda que na atualidade tenhamos, nós, brasileiras e brasileiros,
eleito uma mulher para o cargo de Presidente da República, é
possível identificar o quão distante estamos nós, as mulheres, de
efetivamente sermos reconhecidas e respeitadas também como
“autoridades”. O último Presidente era carinhosamente chamado de
“Lulinha – paz e amor”, ninguém ousou ir além da alcunha.
Vimos na mídia, que o ex-ministro do Trabalho, Carlos Lupi,
envolvido num escândalo de corrupção, esgotadas suas chances de
permanecer no Poder, dirigiu à Presidente Dilma uma estapafúrdia
declaração de amor, a que ela respondeu “não sou propriamente
romântica”. Resguardada a singularidade do episódio, as mulheres
brasileiras são vitimadas pelo desrespeito no ambiente de trabalho,
desde a admissão até a promoção salarial e funcional.
A
lei Afonso Arinos, que abordou a questão do racismo ou preconceito
racial no Brasil, foi proposta e aprovada sem nenhuma alteração em
1951. De autoria do então deputado Afonso Arinos de Melo Franco, em
resposta a um pedido de retratação feito pelo embaixador dos EUA no
Brasil, porque a bailarina afro-americana, Katherine Dunhan, com
espetáculo agendado no Teatro Municipal, foi impedida de se hospedar
em um hotel paulista onde tinha sido a reserva. Isso foi no ano de
1951. Na década de 1960, lemos na revista O Cruzeiro um artigo de
Rachel de Queiroz reclamando que um hotel de São Paulo, em franca
desobediência à Lei vigente, recusou hospedagem à cantora Elza
Soares. A jornalista Glória Maria foi barrada num hotel no Rio de
Janeiro numa data próxima ao Centenário da Lei Áurea (1988) –
nenhum prejuízo teve o estabelecimento, a lei não foi acionada.
Aqui, a despeito da grita do movimento negro organizado, indignado,
espantosamente, por vontade e determinação da própria jornalista,
uma mulher negra, declinou da possibilidade de acionar a lei, e usou
o argumento de que o movimento negro queria se promover à custa do
alcance da emissora televisiva onde trabalhava, que era a Rede Globo.
A
mídia como um todo e em especial as redes de televisão – que são
concedidas por atos da Administração Pública, são pródigas em
construir e reforçar estereótipos discriminatórios contra a
mulher. Espero contar com compreensão de todos porque vou me limitar
aos exemplos relativos à mulher negra e, como estamos falando em
educação para o respeito, não podemos negligenciar os danos
irreversíveis na construção da identidade cidadã e brasileira das
crianças, menino/homem e menina/mulher – como dizemos nós os
mineiros, que são expostos intensamente a esta linguagem
preconceituosa e discriminatória. Quase não se vê pessoa negra ou
mulata estampando manchetes de jornal ou capas de revistas, nem mesmo
Nossa Aparecida mereceu a capa da Revista VEJA, no episódio do chute
da Santa. O periódico, que recentemente tem como associado um editor
sul-africano, colocou na capa a imagem da Virgem Maria com olhos
azuis celeste como o seu manto. No caso, a Santa que o bispo Sérgio
Von Helder da Igreja Universal chutou, chamando-a de feia e
desgraçada, é a Padroeira do Brasil: Nossa Senhora Aparecida.
Ninguém defendeu Nossa senhora Aparecida. (Ano de 2007). Quem
defenderia nós mulheres negras? Quem defende as crianças negras?
Quem defende os brasileiros, dessa mentalidade?
Outro
trabalho destacado destes religiosos neopentencostais, em suas
emissoras de televisão concedidas pelo poder público é
desqualificar as Mães-de-Santo, as Yalorixás, as sacerdotisas das
religiões de tradição afro-brasileira e tudo mais que se refere à
cultura negra, e seguem impunes praticando atos de racismo e
intolerância religiosa nas suas mídias. Notem que os
neopentencostais não tem dirigido sua verve contra os babalorixás,
os pais-de-santo, numa espécie de solidariedade machista.
Foi
veiculada no Jornal Folha Universal de São Paulo, uma foto da
mãe-de-santo baiana, Gildásia dos Santos, Mãe Gilda de Ógun, com
uma tarja preta nos olhos sob a manchete: “Macumbeiros charlatões
lesam o bolso e a vida de clientes”. Seguidores do pastor da
Assembleia de Deus, em Salvador/BA, invadiram o terreiro de candomblé
de Mãe Gilda e desferiram diversos golpes com a bíblia na cabeça
dela e de outros “filhos” da casa, gritando que expulsavam o
diabo. Em consequência de tal agressão, ocorrida no dia 21 de
janeiro de 1999, Mãe Gilda teve um enfarto fulminante. O depoimento
disponível na internet, de uma das “filhas” de Mãe Gilda de
Ógun, destaca também que “as crianças que moram no terreiro de
candomblé e que como os pais, são também ‘filhos de santo’,
sofrem lavagem cerebral nas escolas públicas por parte dos
professores e agressões dos colegas que ficam impunes”. Ainda
acusa a “filha-de-santo” que o mesmo tratamento
discriminatório
e preconceituoso é dispensado pelos profissionais da saúde – que
são dessas religiões protestantes - aos pacientes que são
identificados na triagem como povo de santo, como pessoas do
candomblé. Esses profissionais da saúde, com pleno poder de
decisão, impõem obstáculos ao acesso desses pacientes às clínicas
médicas e passam a fazer, com naturalidade, “orações para
espantar o diabo”, e não os encaminham aos médicos.
A
probabilidade de um paciente negro não ser admitido com celeridade e
isonomia no atendimento à saúde pública está próxima de 100%, a
estatística se repete em outros serviços públicos. Exemplar, no
caso da saúde, foi o ocorrido com o famoso atleta negro, João do
Pulo, João Carlos de Oliveira, que tendo sido vitima de um acidente
de carro, foi deixado durante horas no corredor do hospital sem
atendimento. Essa demora, resultado da discriminação na triagem,
resultou na amputação de sua perna e no fim prematuro de sua
carreira de recordista em salto triplo.
Recentemente
foi dito pela mídia que muitas mulheres negras não tem acesso aos
programas de saúde pública pelo simples ato discriminatório dos
profissionais da Saúde Pública.
Falando
em atleta, recordo quando a ginasta Daiane dos Santos ganhou sua
primeira medalha no Pan-americano de Winninpeg, em 1999, a
jornalista, da Rede Globo, correu até a técnica da seleção
brasileira e perguntou: “A
Daiane tem alguma limitação física-biológica por ser negra?”.
Daiana se revelou campeã. Nas disputas seguintes, foi até preciso
que outra ginasta brasileira, Daniele Hipólito saísse em defesa da
“Pérola Negra”, porque a imprensa insistia em atribuir o
fracasso conjunto da equipe de ginástica olímpica nacional à
presença de Daiane nessa .
Aqui
é o país do futebol, todo mundo sabe disso não é? Recentemente, a
presidente do Comitê Organizador do Mundial Feminino de Futebol da
Alemanha, Steffi Jones, faz a mesma reivindicação das atletas
brasileiras: “Eu gostaria de ver mais mulheres no futebol”. (...)
“Vocês [que somos nós, os brasileiros] têm um dos melhores times
do mundo, elas são bem-sucedidas, mas não são apoiadas em casa”.
A delegação brasileira de futebol feminino foi à Alemanha sem
psicólogos, sem fotógrafos e sem cozinheiros, as próprias
jogadoras preparavam sua comida nos hotéis. Isso é um absurdo.
Marta, eleita há cinco anos consecutivos a melhor jogadora do mundo
e as demais clamam por mais investimento no futebol feminino. Nem as
atletas brasileiras do vôlei desistiram de agredir as “negas” do
time cubano que depois de vencer na quadra a seleção brasileira,
foram agredidas pelas perdedoras no vestiário, sob uma saraivada de
insultos racistas. Um ato registrado nos anais da mídia
internacional.
Outra
imagem de mulher negra comum na televisão é da “mulata”, que
são as personagens do festejado Jorge Amado, as gabrielas que com
cheiro de cravo e canela trazem ao Brasil turistas ávidos por sexo
barato e intenso, cuja preferência recai sob as de menor idade
contratadas, que são apresentadas no exterior, através de “books”,
de internet, pelas redes de prostituição que agem livremente no
Brasil. O famoso assaltante inglês, Ronald Biggs que viveu sob a
proteção da lei no Brasil por décadas, também fazia agenciamento
de “mulatas” como forma de se manter financeiramente. Essa imagem
de jovem mulher e “fogosa” e afrodescendente podemos assistir na
novela da Globo, Fina Estampa, a atriz Carol Macedo, que em novela
anterior despontou como uma criança
agenciada/cafetinada
pela inescrupulosa avó, atualmente essa mesma atriz Carol Macedo
representa uma fanqueira que assedia um jovem estudante e para tanto
sempre engana o severo pai. Ainda em Fina Estampa, temos a Cris
Vianna, outra atriz negra, que vem exibindo o corpo “escultural”
com impagáveis e improváveis banhos de mangueira na laje.
Na
edição 2002 do “Criança Esperança” da Rede Globo, a atriz
Ângela Vieira antes da sua apresentação faz um discurso contra a
prostituição infanto-juvenil, terminado o discurso, tira a capa que
escondia seu traje de dançarina de boate numa reprodução da cena
do filme Cabaré. Então aqui v vale o “Faça o que eu digo e não
faça o que eu faço”. Ainda em novelas da Globo, temos a
personagem da menina negra, interpretada pela atriz Duda Costa,
moradora de um orfanato, que diariamente é torturada pela personagem
da atriz Maria Zilda. No capítulo de ontem, 06/12/11, a personagem
de Maria Zilda, troca a medicação da criança de uma embalagem para
a outra. Uma cena passível de questionamento, porque ‘ensina’
como sabotar um tratamento médico.
Porque
estou falando isto aqui? Exatamente porque a ficção, complementada
pelo poder impactante da imagem sedimenta os preconceitos, naturaliza
a discriminação. Tantas vezes são imagens agressivas, tão
violentas que difundem o medo, e o medo fragiliza as pessoas, as
impede de crescer, de arriscar, de reivindicar seus direitos. (Tem na
internet Mia Couto, um escritor angolano, um texto maravilhoso, um
depoimento dele maravilhoso, sobre o medo, Mia Couto, eu aconselho
todo mundo a ler).
A
juíza baiana, negra e rastafári, Luislinda Valois, hoje
desembargadora do TJ/BA, em Maio de 2010 deu um depoimento na novela
Viver a Vida, da Globo, as imagens sua no Projac foram distribuídas
pela internet e um portal da Rede Record, de acordo com as palavras
da própria juíza: “Ao publicarem uma foto minha ao lado da atriz
global Natália do Valle, creditaram-me como sua camareira” –
continua a desembargadora, “Nada contra as camareiras que
desempenham papel importante como tantos outros. No entanto, isso
revela, (...) uma visão estereotipada por entender que os negros só
podem exercer determinadas profissões na sociedade. Pergunto-me, se
fosse uma loira posando ao lado da atriz, será que a creditariam
como uma camareira ou buscariam apurar melhor a informação?”,
desabafa. “A escravidão, apesar de tantas leis instituídas, ainda
existe e resiste. Só mudou a rotulagem e a forma de acontecer”,
segundo a desembargadora.
Na
mesma novela, “Viver a Vida”, de 2010, tendo colocado no ar o
depoimento da Desembargadora Luislinda Valois no mês de Maio, em
clara alusão ao 13 de Maio, em novembro, exatamente no dia 20 de
Novembro, que é a Data Nacional da Consciência Negra, mostrou uma
cena em que a personagem de Lília Cabral desfere um violento tapa no
rosto da personagem de Thaís Araújo. E essa personagem, ela chora,
cai, fica de joelhos, não tem como responder a isso. Então é a
imagem ensinando, pode sim dar tapa na cara de uma pessoa negra. Essa
justificativa de que é a mentalidade escravista também faz parte de
uma análise do antropólogo Roberto da Matta. Ele diz que a polícia
na sociedade brasileira tem dificuldade de ser democrática. (“Onde
está a Polícia”,
http://www.eagora.org.br/arquivo/Onde-est-apolcia).
Ele observa que “no Brasil, um sistema hierarquizado foi um
obstáculo para a criação de uma organização policial
democrática, válida para todos e, em virtude desse viés, destinada
a agir do mesmo modo em todas as situações”. Continua o
antropólogo, “... criar esse tipo de polícia numa sociedade com
uma elite que possuía escravos e os punia dentro de suas casas,
usando os métodos que julgava mais apropriado?”
A
atriz negra, Thalma de Freitas, recentemente foi conduzida à
delegacia para que fosse feita uma revista íntima na delegacia de
polícia por dois policiais do Rio de Janeiro, ai ela se pergunta:
“Será que temos que ter medo da polícia?” ("É a primeira
vez que passo por essa humilhação. Não há outra coisa a fazer
exceto processá-los por abuso de poder. Por que a loura que estava
sendo revistada antes de mim não veio para cá? Será que artistas
como eu e moradores do Vidigal, negros como eu, precisam passar por
isso? Será que temos que ter medo da polícia? Porque estou aqui?
Sou suspeita de quê? Gostaria que eles me explicassem".)
O
caso do menino Juan de Morais, morto por policiais no Rio de Janeiro,
em junho deste ano. A matéria de Cristina Grillo, na página Opinião
da Folha SP, afirma que a confirmação da morte de um filho é o
pior de todos os temores que uma mãe pode enfrentar. Um temor,
afirmo eu, Maria Luiza, que quase todas senão todas as mães de
criança e adolescente e quiçá pessoa adulta e negra vivencia
diariamente ante a legalidade da sanha assassina da Polícia,
registrada como “auto de resistência” nas estatísticas do
Instituto de Segurança Pública do Rio, em 2010 contabilizaram 855
pessoas mortas, “resistentes”. Ou seja, 855 pessoas foram mortas
por policiais no Rio de Janeiro, o que dá uma média de 2,3 pessoas
por dia.
Voltando
a representação da imagem da mulher. A mídia transformou o parecer
do Conselho Nacional de Educação do MEC que sugeria a suspensão da
distribuição do livro “Caçadas de Pedrinho” de Monteiro
Lobato, num dos assuntos mais polêmicos, valendo até tema
carnavalesco. Afinal, ficou claro que um dos problemas era que a
Editora Globo é a responsável pela distribuição do livro nas
escolas públicas. Então ela não queria levar o prejuízo de ter
que recolher esses livros que fazem alusão ao personagem da Tia
Anastácia, que é uma mulher negra, que trabalha na cozinha. Agora
recentemente o Sítio vai ser lançado como um produto internacional
e a Globo tomou o cuidado de esclarecer que: “Entre as adequações
da obra aos tempos atuais, a versão em desenho do “Sítio”
deixará de lado qualquer resquício escravocrata em referencia a Tia
Anastácia (a mulher negra) que faz parte de alguns livros de
Monteiro Lobato”.
Por
fim, é importante lembrar que no Brasil estamos distantes de um
ideal de isonomia entre homens e mulheres, entre brancos e negros,
mas devemos tentar ao menos separar o Público do Privado, até como
um exercício de cidadania. Ainda que um diretor da Rede Globo não
concorde quando criticado por banalizar a violência contra as
mulheres em sua programação, ele não está dispensado da
observância da lei. Partindo dessa premissa de observância da Lei,
gostaria que me fosse explicado como a Procuradora de Justiça do
Distrito Federal, a Dra. Roberta Kauffman, é advogada voluntária do
Partido Democrata na ADIN contra as cotas da Universidade de
Brasília? Essa Procuradora, Dra Roberta Kauffman, foi orientanda do
Ministro Gilmar Mendes para a dissertação de mestrado que versou
sobre Ações Afirmativas no Brasil como algo obsoleto, considerando
a prevalência do axioma democracia racial brasileira. Atualmente a
Procuradora tem despontado na mídia nacional como uma “autoridade”
contrária às Ações Afirmativas para Negros e Negras. O meu
questionamento é: Será que ela vai aprovar as ações afirmativas
para as mulheres?
O
que temos a sugerir como Políticas Afirmativas
é algo muito simples, mas confiamos em seu efeito imediato:
1.
Estar em constante vigilância quanto ao cumprimento das Leis (porque
a gente não precisa mais de leis, racismo é crime, ponto final.
Incluindo, nessa observância da lei, seus agentes, incluindo aí a
Polícia, em especial, os servidores públicos, que são a base da
pirâmide administrativa. (Discriminação por sexo, religião, cor,
continua sendo crime, então não precisa de outra lei. É proibido
matar, é proibido matar qualquer pessoa, não precisa de uma lei
que: é proibido matar homossexuais, é proibido matar mulheres, é
proibido matar crianças, não precisa de uma lei para isso. É
proibido espancar qualquer um, é proibido provocar a morte por
espancamento, é proibido humilhar, então não precisa de outra lei.
Tem que fazer valer essa proibição, reconhecendo que todos nós
somos pessoas de direito. Então, nossa sugestão é: Nas repartições
públicas tem lá um bilhete, na folha a4, dizendo o seguinte: é
proibido ou é passível de pena de prisão insultar funcionário
público no exercício da sua função. Não tem assinatura de
ninguém, é só um papel branco. Todo mundo que chega lá na
repartição, embora a fila esteja enorme, fica chocado com aquele
aviso ali. Então, vamos colocar ao lado desse aviso que racismo é
crime. Tanto para lembrar aquele servidor público que possa vir a
discriminar alguma pessoa negra que vai recorrer àquele serviço
público – que é tratado com negligência, é conduzido para o
elevador de serviço, ou às vezes nem é conduzido para onde está
procurando esse serviço. Então esse mesmo papel. E é importante, e
aí eu falo como profissional de comunicação, que não tenha
assinatura. Porque quando a gente faz esses cartazes, logo as as
pessoas, também são preconceituosas ou preguiçosas, não querem
ler porque entende isso como propaganda de governo. Então só uma
folha branca, simples, lembrando racismo é crime. Discriminação
por sexo, raça, cor, religião, é crime, passivel de prisão. Todo
mundo vai ler. Igual todo mundo está lendo. Funcionário público
não é mais insultado, porque todo mundo tem medo de ser preso).
2.
Colar em todas as repartições públicas e espaço em que se dá o
atendimento público, cartazes simples, sem assinatura, com o
enunciado da Lei que proíbe o racismo e a discriminação por cor,
sexo, religião, e etc. (nos moldes do aviso sobre agredir
funcionário público): “RACISMO É CRIME - Constituição
Federal Artigo 5º”
3.
Iniciar campanha de esclarecimento sobre o crime de prostituição
infanto-juvenil; para brasileiros e turistas, obrigando os
estabelecimentos comerciais a exibir a advertência para todos; (Eu
não sei sobre a lei da prostituição infanto-juvenil, mas a minha
experiência na militância negra em Salvador, é que acontecia
muito, quando essas menores eram flagradas nos navios que aportavam
em Salvador, na verdade elas apanhavam da polícia, e os turistas
ficavam livres de qualquer coisa. A gente está vendo o que acontece
no Ceará, em Fortaleza, esse afluxo não só por droga mas por esse
turismo sexual também. Então vale a folha também nesses hotéis e
nos estabelecimentos de afluxo turístico: prostituição
infanto-juvenil é crime no Brasil.)
4.
Conter a violência policial;
5.
Incluir vozes femininas e negras nas propagandas oficiais,
especialmente de apelo positivo; e,
6.
Criar uma central de denúncia que seja acessada por todos (e sobre
rodos os assuntos) cabendo ao serviço fazer a distribuição das
denúncias aos órgãos competentes. Tipo um número telefônico com
apenas 3 dígitos, fácil de ser memorizado. (Em vez dos zero
oitocentos, que fica difícil as pessoas lembrarem, um número tipo -
123 - que toda criança aprende a falar, e lá é feita a triagem,
as redes de comunicação estão bastante avançadas, que facilita
esse apelo, para as pessoas buscarem essa ajuda.)
Então
é o que eu tinha a falar, boa tarde a todos.
15.
A Procuradora Federal dos Direitos do Cidadão agradece
a Sra. Maria Luiza Júnior, destacando o cenário profundo e real do
que acontece ainda no nosso país, por ela apresentado com palavras
que foram muito fundo em cada uma das pessoas presentes, reafirmando
o compromisso de todos no sentido de mudar esse cenário, por uma
sociedade inclusiva e sem violência.
16.
Perguntas e Respostas:
1ª.
Dr. Moacir Guimarães Morais Filho. Subprocurador-Geral da
República. Membro Suplente da 6ª Câmara de Coordenação e Revisão
– Índios e Minorias. Dr.
Moacir Guimarães Morais Filho
se apresenta e explica que,
estando em seu gabinete, ligou a rede interna de computadores e se
sensibilizou com este encontro e o anúncio de vários palestrantes,
ficando bastante entusiasmado com os registros que a professora fez
com referência a fatos realmente verídicos, que aconteceram,
principalmente envolvendo uma rede importante de comunicação como é
a Rede Globo. Observa que gostaria apenas de recolher a sugestão da
Sra Maria Luiza Júnior com referência à colocação de uma folha
A4 com esta advertência de que também é crime o racismo, a
discriminação racial, entendendo que a iniciativa deve partir
inclusive do Ministério Público, da Procuradoria Federal dos
Direitos do Cidadão e faz então um encaminhamento no sentido de que
medida seja objeto de uma recomendação, através da PFDC, a todas
as repartições públicas, porque assim ficará mais evidente e
concreta a sugestão. Agradece e parabeniza a professora Maria Luiza
Júnior pelas suas considerações, considerando-as bem oportunas e
bem didáticas.
Resposta à 1ª
pergunta. A Sra. Maria Luiza Júnior agradece a consideração,
observando que essas questões eram muito discutidas no Movimento
Negro Unificado, onde costumava-se brincar assim: “cuidado com o
'pli-plin' da Globo, porque o que nós construímos o plin-plin
derruba”. Explica que isso mostra a a importância de que as
medidas legais sejam transformadas em ações inibidoras, pois apenas
a lei não resolve. Cita como exemplo do Pró-uni, que foi uma opção
para incluir os alunos pobres nas universidades, mas o que se vê é
que esses alunos são escolhidos pelas faculdades, as quais
determinam qual o pobre vai ser o merecedor da bolsa. Assim é
evidente, continua, que a comunidade negra fica cada vez menos
“merecedora” dessas ações afirmativas. Então é muito
importante conscientizar não só os agentes da lei mas os
brasileiros como um todo. A filha de santo cujo caso ela relatou
disse-lhe que nem sabia que podia processar a Igreja Universal pela
morte da mãe dela. Isso foi feito depois e a família veio a receber
uma indenização.
2ª.
Wilson Weleci. Assessoria PFDC.
Propõe acrescentar uma proposta a esta. Considerando que todos têm
uma conta de água e uma conta de luz, sugere que estas advertência
sobre racismo e violência contra a mulher venham a constar também
nessas contas.
17.
A Procuradora Federal dos Direitos do Cidadão, Dra Gilda Carvalho,
agradece a todos e solicita, como forma de reconhecer e destacar a
sugestão da Sra Maria Luiza Júnior, seja já fixada no local da
Audiência uma folha com os dizeres “Racismo é Crime”. Em
seguida convida a Presidente do INEP, Sra. Malvina Tania Tuttman,
para proferir sua palestra.
18. Exposição: Produção de dados com recortes
de gênero e raça. Professora Malvina
Tania Tuttman. Presidente
do Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira-
INEP/MEC.
A Presidente do
INEP inicia sua exposição agradecendo o convite da Dra Gilda
Carvalho, profissional que teve a grande satisfação de conhecer nas
idas e vindas da construção de etapas importantes do pensar e do
fazer do INEP. Manifesta a satisfação de estar reunida com todos/as
para refletir sobre a questão da discriminação, e num recorte
importante sobre a mulher, especialmente sobre a questão da mulher
negra. Apresentando-se como professora da educação pública há 43
anos, que continua acreditando e quer continuar a ser professora, a
Sra Malvina Tuttman observa que esta temática a toca profundamente,
inclusive por suas reflexões tanto no período que atuou na educação
básica como na educação superior, e, neste momento, pela
possibilidade de ter uma visão muito mais ampliada do que poderia
imaginar, estando com colegas pesquisadores do Instituto Nacional de
Estudos e Pesquisas, tendo a dimensão da realidade brasileira, vendo
através de números, não só através das reflexões feitas na
academia, nas pesquisas, mas tendo uma visão do desenho da
intolerância, da discriminação, e, ainda, de quanto precisamos –
já avançamos – mas do quanto precisamos avançar em termos de
políticas públicas nesse país. Na hora de organizar a apresentação
ela se colocou como Malvina, representando as pesquisas e os
levantamentos de dados do INEP, trazendo dados que lhe foram
solicitados na posição de presidente do INEP mas, misturando um
pouco as posições, talvez se coloque também como professora e como
mulher desse país, que esta junto com outras tantas mulheres e
homens também - e não só do Brasil-, que acreditam num mundo de
paz. Observando que gosta das misturas, a Sra Malvina Tuttman
parabenizou a Sra Maria Luiza Junior por sua fala, considerando-a
excepcional, marcante, mesmo para aqueles que já estão convencidos
que muito há a fazer, pois sempre é importante escutar e escutar e
escutar para que se tenha maior poder de convencimento nos lugares
que ocupamos na nossa sociedade e possamos sair das nossas palavras e
ir para ações muito mais contundentes, e a educação formal é um
espaço importante para essas reflexões.
Eu
quero rapidamente falar não sobre o INEP, até porque o INEP muitas
vezes é confundido com o ENEM, eu costumo brincar que eu não sou
presidente do ENEM mas estou presidente do INEP. E o INEP precisa,
deve ser valorizado como um patrimônio do nosso país, ele foi
criado por educadores, um movimento importante de educadores. O INEP
vai fazer 75 anos ano que vem, nós vamos comemorar isto, ele já
teve idas e vindas, já foi discriminado por conta do apontamento de
dados que em determinados momentos da história do nosso país eram
considerados não importantes de serem revelados, melhor silenciar,
então o INEP e a CAPES quase foram terminados, eles terminaram num
dia e surgiram, por conta de movimentos de muitos, num outro dia,
então ele passa por altos e baixos, mas ele é primordialmente um
instituto importante de estudos e pesquisas educacionais.
Principais
ações do INEP. Todas
essas ações que estão ali relacionadas elas contemplam os recortes
de gênero e raça. Então os dados disponibilizados pelos
pesquisadores do INEP, quando fazem os censos
educacionais
tanto da educação básica quanto da educação superior, quando
trabalham no sistema nacional de avaliação da educação básica,
muito conhecido como o Aprova
Brasil,
quando trabalhamos no ENAD,
que é um dos instrumentos para avaliar a educação superior, os
cursos de graduação do nosso pais, o tão falado ENEM
e o Exame Nacional para certificar competências de jovens e adultos,
sempre nesses dados, não só nos instrumento de avaliação mas
também no preenchimento de questionários, de instrumentos para se
ter um perfil dessas populações que passam por esses exames ou
essas coletas de dados, sempre nós temos contemplado esses recortes
de gênero e raça. Agora, é importante, Maria Luiza, todos os
companheiros que estão aqui, é importante dizer que é preciso que
tenhamos instrumentos legais para tornar obrigatória – obrigatória
é uma palavra que eu não gosto – mas enquanto isso não for
percebido como necessário, acho que tem que ser obrigatório, mas
isso me incomoda um pouco, a questão de ser obrigatório. Mas, nos
censos que nós fazemos e em todos os outros instrumentos a
legislação nos impede de tornar obrigatória a resposta quando se
pergunta qual é a etnia, qual é a cor, enfim, qual é a raca, isso
não e obrigatório. Então eu queria retomar um pouco quando você
fala, e eu vou mostrar um gráfico, que há mais mulheres do que
homens negros até a educação básica, e depois isso se inverte, eu
acredito que você tenha razão mas nós não temos dados e quando
você falou isso eu fiquei preocupada, imediatamente, eu telefonei
para Carlos Moreno, Diretor do Departamento de Estatísticas
Educacionais, que coordena esses censos. Até peço desculpas porque
por dois minutos eu não acompanhei teu raciocínio, mas eu fiquei
preocupada com esse dado. Então ele me informou o seguinte: no censo
de educação superior, os homens de todas as etnias, nós temos 2
milhões, 741 mil, 405; e as mulheres são 3 milhões, seiscentos e
trinta e sete mil, 894 mulheres. Então nós temos mais de 6 milhões
de matriculas. Muito bem. Mas não declarada a sua raça, nós temos
2 milhões e duzentos. Não é obrigatório, então não quer
declarar nós não temos como obrigar, não há nada legal, Dra
Gilda, que diga que isso é importante. Para o desenho do nosso pais
esse dado é fundamental, mas no censo que o INEP faz, e é um censo
unitário, não é um censo por amostra, ele vai a todos, a todos os
alunos, a todos os professores, tanto na educação básica quanto no
ensino superior, então isso precisa ver.
Então
não há registro, dois milhões e duzentas pessoas não declararam,
e não há registro nas instituições de educação superior de mais
dois milhões e cem. Dos declarados, nós temos um milhão e duzentos
que se declaram brancos, 535 mil que se declaram pardos, 145 mil que
se declaram pretos (ainda a categoria fica assim), 57 mil que se
declaram amarelos e 8 mil e duzentos indígenas. Então, se nós
somarmos, retirando os brancos, nós temos - de outras etnias – 747
mil e duzentos. E ai nós podemos ver que sem um dado oficial eu não
posso garantir, porque eu tenho quatro milhões e trezentos que não
têm nenhuma declaração, então eu não sei onde categorizá-los.
Mas desses declarados eu tenho realmente mais brancos, mas eu não
posso afirmar, porque eu não tenho esse dado (para a totalidade).
Então, Dra Gilda, depois nos aconselhe de que forma nós podemos
agir para que essa declaração seja importante. E também, Maria
Luiza e todos os colegas – desculpe se estou me dirigindo a você,
Maria Luiza, mas é porque todos se sentem orgulhosos com a sua fala,
eu estou considerando você uma grande representante de todos e como
eu não posso me dirigir a todos eu faço essa citação a você,
espero que não se importe. Então nós não temos declaração. E aí
eu faço uma pergunta que não é para a gente responder agora não,
é para nós todos, para mim mesma: também, por que às vezes os
negros, os mulatos, enfim, por que as vezes não querem se declarar,
não querem dizer o que são. É também importante, eu não estou
aqui responsabilizando ninguém, e se é responsabilidade, é
responsabilidade da nossa sociedade, que vem oprimindo e oprimindo e
oprimindo.
Aquilo
que nós falamos, distribuição da matrícula por sexo Nós temos
muito dados, seriam muitos, o INEP disponibiliza esses dados e os
micro-dados. Outro dia eu fui no Conselho Nacional de Educação,
porque teve uma avaliação sobre educação, uma grande avaliação,
as pessoas me perguntavam: por que que o INEP não faz essas e
aquelas pesquisas, esses e aqueles recortes? Eu devolvi a questão
dizendo assim: onde estão os pesquisadores das universidades?Eu fico
muito à vontade de falar porque eu fim de uma Universidade, há
pouquíssimo tempo. Os dados estão ai, o INEP tem funções sim
importantes, de levantar os dados, de fazer sínteses preliminares
importantes, mas de disponibilizar os dados para toda a população
interessada, principalmente para os nossos pesquisadores e grande
parte estão nas instituições. Então eu faço um chamamento até a
mim mesma, à universidade da minha origem, aonde estão todos, que
nesse momento temos que fazer um grande mutirão. Eu me lembro bem, a
crítica, Dra Gilda, era por que nós não tínhamos disponibilizado
os micro-dados de 2010 sobre a Prova Brasil. E aí eu dizia assim,
está certo, estamos demorando porque há uma série de dificuldades,
mas será que os micro-dados de 2009 são tão diferentes dos
micro-dados de 2010? E onde estão as pesquisas em termos dos anos de
2009... Agora já temos a de 2010. Então nós estamos esperando a
última da última notícia?
E
volto para a temática, para a gente saber que políticas nós vamos
implementar – e quando eu falo de políticas não falo apenas a
nível de política governamental federal, que é importante, mas eu
falo das políticas estaduais, municipais, eu falo das políticas
locais, dos projetos político-pedagógicos de todos os níveis das
instituições, sejam as instituições da educação básica ou da
universidade, todos nós temos a responsabilidade, e nós temos que
nos unir nesse sentido. Então os dados estão postos, pelo INEP,
pelo IBGE, pelo IPEA, então vamos fazer também as pesquisas, não
só para apresentarmos nos congressos - eu fico muito a vontade de
falar isso agora porque já falava nove, dez meses atrás, enquanto
profissional de uma universidade publica federal do Rio de Janeiro.
Mas então vamos mas fazer, mas não adianta um pesquisador, um
grupo, adianta é que todos, ou praticamente todos se engajem, se
conscientizem, porque algumas coisas nós já sabemos: discriminação
nós temos mesmo. Discriminação em relação a raça e a gênero é
patente, não preciso mais de micro-dados para chegar à filigrana de
ver o quanto de discriminação temos, a discriminação está aí,
temos dados já e podemos caminhar. Vamos aos dados. Nesta tabela nós
vemos que, se não fizermos aquela observação anterior ( não tenho
os dados sobre as mulheres negras, e é um compromisso que eu assumo,
na medida em que nós pudermos ter os dados fidedignos, não porque
não perguntamos mas porque as pessoas não se autodeclaram), a
principio, no geral nós temos mais mulheres na universidade.
No
ensino fundamental, nós temos as categorias brancos, pretos, pardos,
indígenas e amarelos. Vejam que as mulheres predominam no ensino
fundamental e no ensino médio também predominam se bem que a faixa
já diminui. Talvez vocês estejam questionando porque eu trouxe
apenas esses dois gráficos.
Nós
temos muitos números, talvez vocês estejam se questionando Porque
me parece que aqui, em termos das mulheres, nos podemos dizer que nós
temos as mulheres predominando... Desculpem-me, me equivoquei, este
gráfico é dos professores. Estamos falando agora dos professores.
Então nós temos mais professoras na educação fundamental e, no
ensino médio temos um equlibrio maior,. No ensino superior o numero
de professoras negras ele diminui de forma bastante considerável.
Antes
de finalizar, eu queria colocar uma questão. Eu queria falar sobre
um outro INEP ainda um pouco desconhecido. Que é o CIBEC, Centro de
Informações da Educação. Nós
queremos
resgatar um pouco das ideias de Anísio Teixeira e transformá-lo num
centro de memória da educação brasileira. Porque eu estou falando
isso agora? Porque na medida em que nós resgatamos isso, nós temos
uma biblioteca belíssima com obras raras, nós temos o tesauros da
educação brasileira, nós queremos criar um museu. Um museu
interativo, em que possamos falar da educação brasileira diferente
do que os livros podem nos apresentar - apesar das transformações
que estão tendo nesse momento – mostrando o porque de políticas
afirmativas. Que bom que no futuro não tenhamos mais políticas
afirmativas. Se me perguntar, você é favorável às políticas
afirmativas?
Não,
mas agora sou. É importante, há um desnível muito grande, há um
compromisso na nossa sociedade para com a população excluída,
então é preciso que tenhamos políticas afirmativas. Mas para poder
conhecer a história da educação, hoje, e até podermos analisar os
avanços e os retrocessos em determinados períodos históricos, é
preciso que tenhamos um museu - eu considero assim – interativo da
educação onde possamos contar a
história da educação associada aos momentos políticos desde a
criação do nosso pais.
Então,
é isso que o INEP está pretendendo nesse momento, e eu espero que
todos os movimentos ligados à questão da luta contra a exclusão,
seja por raça, opção de gênero ou religião, que todos nós
possamos nos unir, todas as representações, e nos ajudar a fazer do
INEP aquilo que ele vem sendo construído mas que ele possa avançar
e possa ser efetivamente ser um reflexo da nossa evolução da
educação, para que as questões não sejam esquecidas. E por isso o
INEP tem condição de criar um Centro de Memória que possa ter não
só um centro em Brasília, mas também, segundo a recuperação das
ideias de Anísio, possa ser ramificado por tantos espaços em todas
as unidades federais do nosso Brasil. Essa é uma proposta que vai
ser ainda consolidada numa discussão que eu gostaria que
participantes que estão aqui nessa audiência pública pudessem
estar, e a minha estimada, me permita dizer assim, admiro muito o
trabalho que a Dra Gilda e que os demais procuradores têm feito em
prol da discussão de um país mais justo.
Muito
obrigada e peço desculpas se avancei um pouco nos minutos que foram
concedidos. É um prazer estar aqui com todos vocês.
19.
A
PFDC agradece a Presidente do
INEP, observando que todos temos a consciência de que o INEP é um
instituto importante para a educação brasileira, para os
brasileiros, e estamos na torcida para que a senhora consiga alcançar
essas metas que sempre traz nas suas exposições e agora com esse
compromisso de trazer esse recorte de gênero e raça nas pesquisas
educacionais que a senhora possa fazer.
20.
Perguntas
1ª.
Denise Carreira. Relatora Nacional para a Educação – Plataforma
DHESCA Brasil. Parabenizando
a professora Malvina pela exposição, assinala que a vitalidade e
paixão que ela empresta a suas exposições traz todo um outro
lugar, uma outra atitude, outra postura para esse desafio que sabemos
ser complexo.
Perguntas: Primeiro
com relação a esses
desafios das desigualdades. As pesquisas, os cruzamentos, as análises
que possam explicitar melhor as desigualdades, que é um desafio do
nosso país. Nós sabemos que as universidades elas têm um desafio
sim, e têm, devem enfrentar esse desafio, que é de interesse
público. Mas diante da realidade brasileira, marcada por profundas
desigualdades seria importante que a gente avançasse em processos
que permitissem esse monitoramento, visando também subsidiar
políticas de equalização. Com certeza nós temos ai uma base de
dados, existem muitas possibilidades, mas acho que a gente precisa
avançar mais no tratamento dessa informação. Como nós colocamos
na apresentação, nós saudamos muito a iniciativa tanto do
observatório da equidade, o observatório também das desigualdades
de gênero e de raça, mas são iniciativas que muitas vezes não
conseguem fornecer análises periodicamente e de forma mais
organizada. Então é importante que a gente consiga avançar nessas
análises visando subsidiar políticas. Então, para além das
universidades, volto a bola aqui no sentido da importância do INEP.
Principalmente as questões de raça e gênero, campo e cidade,
precisava ter um acompanhamento mais preciso por parte do INEP. Essa
é uma provocação. A outra é com relação ao censo escolar e ao
papel das secretarias escolares. Porque no nosso trabalho com as
escolas, na ponta, a gente sente que as secretarias escolares
precisam de uma formação – teve somente uma formação que
aconteceu, acho que em 2005-, para as secretarias escolares com
relação ao preenchimento do quesito raça e cor, de como abordar,
de como trabalhar isso com as famílias. Então eu sinto que a gente
precisa retomar esse ponto, da formação das secretarias escolares
com relação ao quesito raça e cor, precisamos ter uma estratégia
para isso. Inclusive para enfrentar esse desafio que a senhora coloca
da não declaração, que nós sabemos que é um desafio complexo,
tem a ver com todo o racismo, com toda a lógica que está ai, que
desvaloriza o ser negro na sociedade, então é difícil essa
construção do pertencimento racial num país racista, que
historicamente desvaloriza esse pertencimento. Para fechar, com
relação à possibilidade de se fazer esse censo específico também
com relação aos alunos travestis e transgêneros.
2ª.
Maria Luiza Junior – Movimento Negro Unificado.
Professora
Malvina, eu gostaria de entender porque, estando a lei 10.639 dentro
da lei de Diretrizes e Bases, o ENEM não contempla perguntas
relativas à história da áfrica e dos afro-brasileiros. Porque se é
lei, está dentro da lei, não precisa de mais nada. A impressão que
eu tenho, com meu olhar de comunicadora, é que quando os colégios
perceberem isso eles não vão usar desculpas, se está no
vestibular e se está no ENEM, eles vão colocar efetivar dentro dos
seus currículos. Então isso é muito importante conseguir isso, o
ENEM pode fazer isso, não precisa consultar ninguém.
3ª.
Senhor Ventura. Movimento Negro Unificado. Quilombola. Sou
quilombola, filho de quilombola, mulher lavadeira e guerreira que
sobreviveu aos massacres da mineração em Minas Gerais. Todos os
dias nós olhamos para trás e falamos que minha mãe ela era de um
grande saber porque ela dizia que nós só iríamos conquistar alguma
coisa através da educação. Quando nós falamos da lei 10.639,
porque ela resgata toda a história das mulheres negras de Minas
Gerais. Minas Gerais esconde um dos maiores quilombos que teve no
Brasil depois de palmares, o quilombo do Ambrósio, do Núcleo da
Serra do Salitre, escondido até pelas faculdades de história de
Minas Gerais, onde a mineração tomou conta de todos e oprimiram o
negro, que eu tenho irmãos de cor, primos primeiros da minha cor,
que não se enxergam negros. Porque? A opressão foi tanta que ele
nega que é meu parente e que é negro. E vamos conseguir isso como?
Resgatando, através da educação, os valores perdidos no passado. E
a gente precisa do Ministério Público, porque nós fizemos todas as
ações possíveis: Defensoria, Ministério Público, e a lei está
lá travada, não andou. E a gente queria saber, porque a nossa
confiança no Brasil é no Ministério Público, porque onde está a
mineração, os latifundiários, que através dos nossos documentos
de posse eles mudaram todos os nossos testamentos, inventário, e nos
negam a posse da terra. E os latifundiários e os invasores têm mais
valores desde a invasão das nossas terras, porque foram os poderosos
que falsificaram e nos tomaram a terra. Então a gente queria saber
até que ponto o Ministério Público pode criar políticas públicas
que realmente cheguem nos quilombos, nas mãos das quilombolas, para
que elas possam dar o sustento, e sair da panha do café, escravas
nas suas próprias terras.
3ª.
Sra Santana. Eu
queria saber quando o INEP vai desenvolver alguma pesquisa em relação
à integralização da escola,
para jovens,
principalmente para as pessoas que trabalham que são mães que não
têm como e onde deixar seus filhos, e seria uma questão bem
relacionada com a sociedade mais carente.
4ª.
Leandro. Estudante de Comunicação. Jornalismo. 6º Semestre. Em
relação a se criar mecanismos que de certa forma obriguem as
pessoas a colocarem lá a sua cor, sua etnia, eu fiquei pensando em
como se criar um mecanismo dessa forma uma vez que o Brasil é um
país de miscigenação e as pessoas em grande parte dos casos não
sabem qual é, na verdade, a etnia dela. Tem pessoas que são brancas
mas acham que são amarela, tem pessoas que se consideram pardas e
outras negras, não sendo. Inclusive teve alguns casos, por exemplo o
caso de alguns anos atrás, de irmãos gêmeos que foram considerados
negros e outros não. Porque é uma questão muito complexa para que
se possa criar um mecanismo que as pessoas vão dizer: eu sou negro,
eu pardo, eu sou amarelo, é difícil, e eu queria saber como poderia
ser esse mecanismo.
5ª.
Wilson Waleci. Assessoria PFDC. Eu gostaria de saber se existe
no INEP pesquisa histórica sobre educação, porque, por exemplo, a
minha mãe fez 82 anos agora e tempos atrás ela falou que depois da
abolição uma das leis dizia que filhos de negros só poderiam
estudar ate a 4ª série. Depois, uma outra lei, que os negros só
poderiam estudar à noite e até a 4ª série. Se o Estado colocou
leis proibindo os negros de terem acesso à educação, houve um
racismo institucional. Se hoje o Estado indeniza, repara pessoas
perseguidas pela ditadura militar, acho que minha mãe tem o direito
a ser reparada, e eu como filho dela que fui prejudicado. E fico
vendo, o Ziraldo recebeu um milhão de reparação, porque foi
perseguido pelo regime militar, e é contra as cotas. O que houve foi
uma reparação e o que minha mãe quer seria uma reparação, então
eu queria saber se existem pesquisas sobre o assunto, para que possam
ser usadas como argumentos em defesa da política de cotas, das ações
afirmativas.
6ª.
Denise Carreira. Só
com relação aos cruzamentos, Dra Malvina, nós no informe Gênero e
Educação tivemos muita dificuldade, até conversamos com várias
entidades do campo da inclusão, para conseguir abrir os dados
mulheres e homens deficientes que estão no ensino regular e na EJA e
pessoas com deficiência por raça/cor, então esses cruzamentos são
de fato bastante difíceis para a gente conseguir, mesmo com os
micro-dados.
21.
Respostas. Presidente do INEP. Dra. Malvina Tuttman.
Denise,
também é um prazer muito grande sempre lhe ouvir. Em relação aos
dados coletados, o INEP tem, como falei anteriormente, mais do que
obrigação de fazer, e faz, todos esses recortes com relação a
raça, ao gênero, ao campo, a pessoas com deficiência, enfim,
fazemos isso. Em relação a raça/cor eu não vou me aprofundar
porque nós temos essa dificuldade e eu não sei, como exatamente eu
não sei. Não sei se é um mecanismo legal e jurídico e por isso
até quero me aconselhar com a Dra. Gilda e outros profissionais
que possam nos orientar formalmente, não nesse momento, uma
consulta formal do INEP no sentido de ver que mecanismos podemos ter.
Eu não sei, fica essa pergunta e reafirmo essa pergunta como
fundamental e importante já que nos não temos precisão nos dados
em relação a raça/cor.
Políticas
de equalização, tratamento da informação, monitoramento. Há
necessidade não só do INEP, o INEP não pode fazer todas as
pesquisas, que pesquisas são inerentes à missão do INEP. As
pesquisas em termos das políticas públicas que estão sendo
implantadas e que vêm sendo desenvolvidas. É preciso que cada vez
mais possamos ter políticas que acompanhem, políticas de avaliação
– ações de avaliação, metodologias de avaliação – que
acompanhem e possam não só levantar os dados mas que possam dar
respostas. Mas o INEP, assim como o IBGE, o IPEA, trabalha também,
não só, mas também estatisticamente. Então muitas pesquisas são
importantes, algumas nós realizamos, pesquisas macro, mas pesquisas
mais focadas são importantes, Santana, como essa que você realiza,
é preciso que outras instituições realizem, sejam sacudidas por
essa necessidade. Então é preciso que o INEP também direcione,
fomente pesquisas em relação a essas ações que estão sendo
desenvolvidas ou não, e verifiquem de que forma elas estão sendo
desenvolvidas, e o que pode ser feito. Mas ele não tem essa
atribuição de fazer todas as pesquisas que o país precisa,
mas sim disponibilizar, dar transparência a todos os dados, para que
esses dados também sejam trabalhados por diferentes instituições.
Não estou tirando o INEP dessa situação porque ele é um instituto
de pesquisas, também, mas ele não dá conta de fazer todas as
pesquisas que o país precisa, então é necessário que possamos
dizer quais as pesquisas que são importantes para evidenciar se as
políticas públicas em relação à educação estão atingindo as
metas, por exemplo, traçadas no PNE, para dar uma ideia.
ENEM.
Questões históricas. O ENEM, Maria Luiza, tem que contemplar
mais essa questão histórica, mas essa última edição do ENEM já
tivemos algumas questões referentes a isso. Mas muito pouco ainda.
Prof.ª.
Maria Luiza: A
mim não pareceu que tinha uma resposta certa, todas as respostas
poderiam ser encaixadas, a mim me pareceu mais uma opinião.
Prof.ª
Malvina Tuttman: Não
Maria Luiza, eu não me lembro exatamente da questão, mas há uma
resposta certa porque saiu inclusive no gabarito, não foi
questionado pelos professores, enfim, mas você tem razão, já há
isso, mas há que se ampliar mais e mais, porque esses instrumentos
de avaliação mas são também indutores de mudança de práticas.
Essa ai é uma defesa que nós fazemos também da importância do
ENEM, mas que não cabe nesse momento, que já ultrapassei.
Racismo
e reparação. Pesquisas e dados históricos.
Wilson, de uma certa forma eu já falei sobre a questão da pesquisa
e por isso há a proposta nesse momento de ampliar as ações do
INEP, não só para avaliações em larga escala e para levantamentos
estatísticos importantes, e logicamente para alguns cruzamentos
importantes, mas também para a questão da História da Educação.
E há pouco eu falei, sobre esse centro de memória que nós queremos
ampliar e com isso vamos contar, logicamente, com a participação de
profissionais, de movimentos importantes, que tratam dessa questão
sob vários olhares. Então, de uma certa forma é isso.
Formação
para as Secretarias Escolares.
Denise, importantíssima a questão sobre do gênero, de
verificarmos a formação das Secretarias Escolares. Nós estamos
fazendo e vamos fazer agora uma discussão do Censo no Maranhão dias
12 e 13. Porque no Maranhão? Porque os IDEBS do Maranhão são os
mais críticos do nosso país, então nós estamos reunindo as
Secretarias de Educação do Estado e do Município no Maranhão,
quando nós vamos discutir essas questões, inclusive as conceituais,
até para entender porque que é importante preencher
adequadamente, não só
burocraticamente, o censo. E ai na questão preenchimento pelas
secretarias escolares, vamos trabalhar não só as questões
conceituais, os construtos, mas também a questão logística, de
como preencher adequadamente para termos um retrato mais fidedigno na
educação do nosso país. Eu queria falar muito com vocês, mas
certamente a Dra Gilda vai fazer outros momentos como esse, e eu
terei o prazer, se não estiver aqui falando desse lado com vocês,
estarei do outro lado, ouvindo e aprendendo. Muito obrigada e
desculpe pelo avanço do horário.
22.
Exposição: Produção de dados com recortes de gênero e raça.
Dra. Ana Lúcia Saboia. Gerente
de Indicadores Sociais do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística – IBGE.
Boa
tarde, o IBGE agradece o convite de estar aqui no dia de hoje, é
muito importante que o instituto de estatística, órgão oficial do
governo, retrate a sociedade, aliás essa é nossa missão
institucional, retratar a realidade para que se possa exercer uma
plena cidadania. Então a nossa responsabilidade é muito grande e o
objetivo da minha apresentação hoje aqui é apresentar esse
esclarecimento de como se produz dados de cor ou raça nas pesquisas
do IBGE. E também divulgar uma publicação que nós acabamos de
fazer e que tem um conjunto muito grande de dados com essa variável
cor ou raça, justamente sobre todos os municípios brasileiros -
“Indicadores Sociais Municipais -Uma Análise do Universo do Censo
Demográfico 2010”.5
Então, eu acho que é importante falar que existem informações
bastante, agora em número grande, para os cinco mil quinhentos e
sessenta e cinco municípios (5.565), depois do advento do Censo de
2010.
Esse
primeiro quadro (“Variável cor/raça nas pesquisas domiciliares do
IBGE”) é muito importante explicar como é que estas categorias
raciais do IBGE e no Censo demográfico foram construídas. O Brasil
é o pais da América Latina que tem a série mais extensa sobre a
investigação da cor ou raça da população. A gente tem essa
pergunta desde 1.872, nesse Censo. Esse Censo, quem declarava: a
população livre, ela que definia sua cor e a população escrava só
poderia definir a cor como preta ou parda. Como podem ver os anos, as
categorias são praticamente muito semelhantes. Branca, preta,
mestiça e cabocla em 1890, foi passando e chegando aqui... não
tivemos o censo em 1970 e de 80 para cá essas categorias ficaram:
branca, preta, parda e amarela. Em 1991 entrou uma outra categoria
que foi a indígena, que na verdade foge um pouco ao conjunto de
categorias desse sistema de classificação que, como eu disse,
existe há muito tempo. É interessante, voltando aqui um pouco em
1940, surge essa categoria de “amarela”, justamente depois que
começaram os movimentos de emigrantes japoneses e asiáticos a
chegarem no Brasil. Alguns estudiosos dos sistemas de classificação
dizem que uma das razões pelas quais esses emigrantes foram chamados
para o Brasil, justamente em 1920 e 30, foi para “embranquecer” a
população brasileira, que naquela época era maior a população de
cor ou raça preta ou parda.
Então,
só para mostrar para vocês que essa série é longa, existe há
muito tempo, mas desde o Censo de 1991, nós temos discutido com a
sociedade civil e com a academia justamente um repensar desse sistema
de classificação. Saber se ele está bom, se está atendendo, se as
pessoas querem se classificar dessa forma. Porque, na verdade, o ato
de se classificar pode ser muito bom se ele for construído de uma
forma democrática, se as pessoas se sentirem representadas naquele
grupo. O ato de classificar ele existe desde que começaram os
estudos de botânica, quando tiveram as primeiras preocupações em
dizer: essas árvores são desse conjunto, essas são desse outro.
Então classificar-se não quer dizer algo ruim, pelo contrário.
Você se classifica por identidade ou por não identidade. Por
diferença ou por identidade.
Então
o sistema de classificação, é interessante que ele exista, mas
precisa ser construído democraticamente. Eu me sinto muito a vontade
de falar sobre isso, porque estou, vai fazer quase trinta anos
trabalhando com estatística e na minha área é que se desenvolve o
projeto de estudo do sistema de classificação, então eu sou
bastante comovida com esta questão e desde o censo de 1991 já havia
essa preocupação, nós fizemos várias consultas e chegamos à
conclusão que a gente deveria fazer um reestudo. Mas como sempre, o
que acontece, o país, a nação, o Estado ainda não tem uma
confiança total, não acredita muito em estatística, em pesquisa,
então a gente não tem recursos todo ano para fazer estudos sobre
isso. Então em 91 já havia uma parte dos movimentos da sociedade
civil querendo fazer algumas modificações, mas não houve tempo
hábil para fazer no de 91. Inclusive teve uma campanha muito grande
em 91, não sei se vocês lembram, muito interessante, que apareceu
na televisão e vários cartazes, que foi “Não deixe passar em
branco sua cor”. Foi um censo que foi muito interessante, houve
muita gente respondendo a esse quesito, que é o quesito de
autodeclaração. E quando foi chegando o Censo de 2000, um dos
presidentes do IBGE na época, dois ou três ele quis fazer uma
tentativa de modificar e fazer com que esse sistema atendesse melhor,
então nós fizemos uma pesquisa em 1998 nas seis regiões
metropolitanas do país, mas considerando, junto – outra coisa que
quero deixar bem claro: o IBGE não pensa sozinho, não sou eu lá
dentro da minha sala e com as pessoas que trabalham no IBGE é que
agente decide essas coisas. Nós temos um Conselho Consultivo com
pessoas de várias áreas, especialistas. Nós chamamos os
especialistas para discutir com a gente todas as mudanças de
questionário e tudo. Então, nessa época, em 2000 houve esse
problema que a gente fez uma pesquisa mas os resultados não foram
satisfatórios o suficiente para que houvesse uma mudança do sistema
de classificação. Que se mudasse, tivessem outras categorias, ou se
aceitassem uma múltipla categorização, etc. Eu sou testemunha, em
2000 estávamos lá tentando, começou 2002, um projeto para fazer,
estudar e tal, resultado: nunca tinha dinheiro, ninguém se
interessou para fazer isso mas conseguimos, graças a nossa equipe,
fazer uma pesquisa em 2008 para rever, tentar entender esse sistema
de classificação. E essa pesquisa foi feita, que nós consideramos
muito pequena, 15 mil domicílios, o que é considerado um
survey de porte bastante bom, mas infelizmente só
pudemos fazer fazer esses 15.000 domicílios divididos em cinco
unidades da federação e o Distrito Federal. E essa pesquisa foi
super interessante, eu vou falar sobre dela um pouquinho mais para a
frente, porque justamente a gente pergunta sobre o pertencimento, se
a pessoa sabe dizer sua cor, e tem uma série de questões
interessantes ai que a gente quer colocar no debate público mas
ainda enfrentamos dificuldades.
Eu
queria dizer também que a variável cor/raça do IBGE, hoje em dia –
desde 1987 – na PNAD, que é a Pesquisa Nacional de Amostras por
Domicílios – que é uma amostra de 150.000 domicílios anuais,
essa pesquisa vai a campo todos os anos, e tem essa variável da cor
que sempre é respondida, ou seja, todas as informações que tem
nessa pesquisa podem ser cruzadas por cor ou raça. A PME, passou a
ter desde 2004, a PME é a Pesquisa Mensal de Empregos, todos os
meses, quantas pessoas estão desempregadas por cor, quantas saíram,
enfim, tudo sobre mercado de trabalho dá para fazer por cor. E a
POF, que é a Pesquisa de Orçamentos Familiares, teve nos anos de
2003 e 2008, também contém essa variável. Então a gente pode
conhecer os orçamentos das famílias que são de cor preta, de cor
parda, indígenas ou brancas. Então é só para dizer que o IBGE
está perseguindo essas questões já a algum tempo em todas essas
pesquisas. Aqui não está aparecendo bem no slide, mas nesse censo
de 2010 a gente teve um grande desafio que foi colocar a pergunta de
auto-identificação da cor no questionário básico que foi aplicado
a todos os domicílios. Houve, de uma certa forma, uma surpresa muito
grande, porque a gente teve pouquíssima subdeclaração, ou seja, a
não declaração ao quesito foi mínima, foi residual, a população
brasileira respondeu ao censo nessa questão. É importante explicar
que, como essa pergunta foi feita para todo mundo, nós podemos ter
agora essa realidade do município com muito mais critério porque
nos estamos considerando as variáveis estruturantes dos indivíduos
são: sexa, idade e a cor. Então, tudo que tem no censo, todas essas
informações podem ser cruzadas. Aliás eu fico super empolgada,
época de censo é fantástico, a gente consegue fazer uma série de
estudos, a gente consegue conhecer o Brasil por dentro.
Nesses
estudos que eu vou mostrar rapidamente para vocês, nós vimos a
questão do analfabetismo, vimos que o Brasil melhorou muito, ótimo,
mas ainda tem um grande número de municípios onde a taxa de
analfabetismo é superior a 25%, o Programa Brasil Alfabetizado está
se preocupando com isso, mas a gente descobriu que desses 1.304
municípios que têm uma população com 25% de analfabetos, tem 564
municípios que não têm programa de EJA. Então, o Censo te dá
todas essas possibilidades de conhecer o nível micro, de ver como
está naquele município, aquelas pessoas, a renda, o que está
acontecendo ali. Isso é uma visão do Brasil que a gente só tem de
dez em dez anos, e a operação censitária é de uma complexidade,
que aqui não dá para contar para os casos que existem nos Censos,
você fazer um Censo num país de extensão continental como o nosso.
Então,
a pesquisa das características Étnico-raciais da População foi
uma pesquisa que tinha objetivos múltiplos para compreender melhor o
atual sistema de classificação da cor ou raça utilizado nas
pesquisas domiciliares do IBGE, contribuindo para seu aprimoramento.
A pesquisa trouxe uma inovação metodológica: a seleção exclusiva
de um (1) entrevistado por domicílio, ou seja, a gente pegou a
declaração daquela pessoa exatamente sobre ela, a gente só fazia
uma pessoa por domicílio, numa amostra como foi essa. E isso foi
muito difícil, porque se você sorteia a pessoa e ela não está em
casa, tem que marcar encontro, selecionar para o celular da pessoa,
marcar no bar da esquina, no trabalho, porque responder ao IBGE é
uma obrigação do cidadão brasileiro. Mas houve muita aceitação,
não tivemos problema com isso não.
Essa
pesquisa, nós a divulgamos em julho desse ano, ela foi a campo em
2008, ela está na internet, todo mundo pode fazer um download,
é de graça e tem informações muito importantes. Uma das primeiras
perguntas que nós fizemos nessa pesquisa foi se a pessoa saberia
dizer a sua própria cor ou raça, e 96% disse que saberia dizer,
quer dizer, as pessoas sabem dizer o pertencimento delas, não existe
erro. Se você pergunta qual é a sua cor, eu posso dizer que acho
que sou morena, mas se ai o IBGE me diz: na classificação do IBGE
tem branca, parda, preta, amarela e indígena, qual que a senhora se
classifica? Bom, eu posso querer dizer que sou morena, mas se eu
entro nesse sistema de classificação, eu me consideraria branca,
porque na sociedade brasileira eu me sinto dentro do correspondente
ao que quer dizer a pessoa de cor ou raça branca. Enfim, é uma
questão de identidade, mas tem esse sistema que está aqui, que pode
mostrar que existe uma grande consistência dessas respostas, apesar
do sistema ser fechado e não admitir múltipla resposta, nem
perguntar a origem, nem pertencimento, apenas pergunta “qual é a
sua cor”. Uma coisa interessante, nessa segunda tabela. As Unidades
da Federação (U.F) que nós fizemos a pesquisa foram Amazonas,
Paraíba, São Paulo, Rio Grande do Sul, Mato Grosso e Distrito
Federal. Aqui tem uma média desses estados, não quer dizer que é o
Brasil. Por exemplo, a categoria negra só atendeu a 7,8% das
respostas. A categoria parda atendeu a 13,6%, em média, das
respostas, a morena atendeu a 21,7%. Ou seja, a gente não poderia
dizer que em 100% das respostas as pessoas querem se classificar como
negras, mas o conjunto de pessoas pretas e pessoas pardas, dependendo
do tipo de pesquisa e de como você está classificando, explicando
que são dois grupos étnicos que podem ter pertencimentos
diferenciados. Você pode juntá-los, por questões estatísticas de
representatividade, mas na verdade são dois grupos, porque nem todas
as pessoas que são pardas querem ser chamadas de negras ou são de
origem afro, são pessoas que têm origens diferenciadas; podem até
se chamar de negros por identidade de opressão, de discriminação.
Então,
sendo muito rápida, esta publicação “Indicadores Sociais
Municipais” também está na internet, a gente acabou de divulgar,
tem um mês, ela tem um capítulo sobre cor e raça, nós fizemos
aqui uma série de tabulações e vimos que existem no Brasil um
conjunto de municípios que 99% da população se classificou como
branca e em outros 99% das pessoas se classificaram como pretas ou
pardas. Então o censo te dá uma visão do Brasil em todos esses
aspectos. Aqui na questão de gênero, também tudo pode ser visto
também com esta questão homem/mulher, as diferenças. Eu fiz mapas
para mostrar essa distribuição da população e parece bastante
interessante como faz todo sentido do ponto de vista histórico, da
distribuição da população pelo território nacional. Então vocês
podem ver que no norte e no nordeste tem menos população que se
declara branca do que no sul. No sul tem bem menos pessoas que se
declaram pretas ou pardas. Infelizmente, não dá tempo de detalhar,
fazendo uma análise mais histórica e mais do território, mas no
livro está feita a análise e vocês podem ver. Nessa publicação
tem uma série de dados por tamanho de município, nós fizemos a
razão entre as médias de rendimento, mostrando que existe uma
diferença muito grande de renda entre as pessoas brancas e pardas e
pretas, fizemos as duas ou três combinações, enfim, infelizmente
não dá para detalhar os dados, mas isso é para mostrar que temos
uma quantidade muito grande no IBGE, quem quiser pode entrar em
contato conosco no IBGE, nós atendemos a todos os usuários, não
temos discriminação nenhuma, o IBGE tem um 0800 e os contatos:
ana.saboia@ibge.gov.br;
Leonardo.athias@ibge.gov.br;
jose.petrucelli@ibge.gov.br.
Nós
três
podemos atender vocês em algumas questões relativas a categorias de
cor, a todos esses seminários e consultas que a gente faz com os
movimentos da sociedade civil e com a academia, quem quiser entrar em
contato conosco e colaborar, analisando esses dados, vendo que eles
estão contribuindo para alguma coisa, porque é muito frustrante não
ter feed-back,
temos alguns mas eu gostaria de ter mais. Muito obrigada e até a
próxima.
23.
Dra Gilda Carvalho agradece
exposição e pede a compreensão dos participantes para anotarem as
perguntas e fazê-las ao final de todas as apresentações, diante o
adiantado da hora. Observa sua satisfação por estarem disponíveis
as publicações, estudos que certamente podem orientar a PFDC em
relação aos seus planos de trabalho e a outros órgãos presentes.
24.
Exposição: Ações pela promoção do respeito aos direitos das
mulheres à não discriminação nos meios de comunicação – Sra.
Ângela Maria de Lima Nascimento - Diretora de Programas da
Secretaria de Políticas para a Promoção da Igualdade Racial -
SEPPIR
Boa tarde a
todas e todos, trabalho na SEPPIR e na Secretaria de Promoção de
Políticas de Igualdade Racial, nós trabalhamos com as políticas de
ações afirmativas, agradecemos esse convite para compartilharmos
com vocês o que nós estamos realizamos e ao mesmo tempo quais são
os desafios que nós encontramos, no contexto de uma instituição
recente dentro do Estado Brasileiro, cujo objeto principal é
promover políticas de combate, de superação da discriminação
racial. No início do ano, movidos pela elaboração do Plano
Plurianual do Governo Federal, nós fizemos o planejamento interno e
uma das questões centrais na nossa análise sobre a realidade
brasileira diz respeito exatamente a esta representação que foi
construída negativamente sobre o ser negro. E no caso das mulheres,
essa representação construída sobre nós mesmas tem um poder, um
impacto, sobre os acessos diferenciados, digamos assim, as
desigualdades que nós temos enquanto mulheres, no caso das políticas
públicas. Então, seja na hora de termos acesso ao mercado de
trabalho, seja na hora de sermos entrevistados - ainda é comum nós
identificarmos nos classificados de jornais a tal da “boa
aparência”, e esta “boa aparência”no Brasil tem um
significado para nós bastante explícito do ponto de vista da cor,
há vários e vários exemplos que precisaríamos muito tempo para
debruçar sobre isso.
Dentro da
institucionalidade que assumimos, a SEPPIR compreende que um dos
objetivos principais desse plano é exatamente reverter as
representações negativas sobre o sujeito negro que estão presentes
no conjunto dos meios de comunicação e que estão presentes no
dia-a-dia das relações sociais. Relações sociais que foram
construídas historicamente com base nas desigualdades entre negros e
brancos e também população indígena. Então, dentro da missão da
SEPPIR que é
promover a igualdade e a proteção dos direitos de indivíduos e
grupos raciais e étnicos afetados pela discriminação e demais
formas de intolerância, com ênfase na população negra, nós
estamos priorizando junto aos diversos Ministérios, principalmente
aqueles Ministérios cuja ação tenha um impacto no sentido de
reverter essas representações – por exemplo no campo da
educação, no campo da cultura, no campo do patrimônio histórico –
uma vez que, quando a gente traz à tona o lugar socialmente
construído para a mulher negra, é um lugar marcado pela
invisibilidade. Ou, quando da visibilidade, é uma visibilidade
associada a estereótipos negativos, a estereótipos que acabam
fazendo com que esta mulher negra seja posta como menos humana do que
a mulher branca. Então para chegarmos a isso hoje, para chegarmos
ao estabelecimento dessa missão, nós temos que levar em conta - e
ai quando Ana Saboia coloca os dados do IBGE nós compreendemos - o
quanto tem sido importante a luta dos movimentos negros em torno
dessa visibilidade. Depois eu vou voltar durante o debate, porque
essa questão do processo de identidade da população negra, como o
jovem colocou antes, há uma problemática de nós nos
identificarmos? O que que representa o percentual de pretos ainda
baixo em relação a quantidade de pretos que nós temos.
A
gente sabe, enquanto instituição, que o componente racial foi
construído de forma a estruturar relações entre os segmentos, que
acabaram negando este sujeito negro. No caso das mulheres negras, a
gente percebe que, apesar da quantidade de mulheres negras – e se a
gente pega os últimos dados, o percentual de mulheres negras no
Brasil - nós temos, a maioria da população: mulheres; e entre as
mulheres brancas e negras a maioria mulheres negras. As
mulheres representam 51,3% da população brasileira, sendo 49,3%
mulheres brancas e 49,9% mulheres negras.
Então,
para a SEPPIR, há que se trabalhar junto aos Ministérios no
sentido agregarmos políticas públicas que contribuam para trazer a
visibilidade dessas mulheres, seja a partir da produção de
pesquisas, mas também que essas pesquisas, que essa visibilidade
possa se traduzir em políticas públicas. Mas também uma das
questões com as quais nos deparamos tem sido a presença da prática
da violência em diversos tipos de violência sobre estas mulheres
negras. Ora, se a gente pega do ponto de vista do acesso das mulheres
negras ao rendimento, ao mercado de trabalho, nós vamos encontrar
que há um percentual significativo de mulheres negras no trabalho
doméstico. O trabalho doméstico, além de concentrar um percentual
de mulheres negras, ele ainda apresenta-se como um trabalho
precarizado do ponto de vista de outras ocupações. Apesar do
reconhecimento que a Constituição traz em torno da categoria das
trabalhadoras domésticas e dos trabalhadores domésticos, essa
categoria ainda apresenta-se submetida, subordinada a práticas de
grandes formas de discriminação. Nós inclusive estamos trabalhando
com a SPM no sentido de trabalharmos uma parceria, uma vez que a SPM
está voltada para as políticas de promoção para as mulheres e a
SEPPIR para as políticas da promoção da igualdade racial, mas
quando se fala em mulher negra é preciso trabalharmos exatamente
essa relação entre o combate ao racismo e o combate ao sexismo. E
ai a gente tem construído, tem aprofundado, na SEPPIR mas também
com base nas pesquisas de pesquisadoras negras, o conceito da
interseccionalidade, no momento em que ele permite a nós gestores
identificarmos como trabalharmos com ações políticas que consigam
fazer o enfrentamento do sexismo e do racismo.
A
pauta principal para hoje, vocês nos provocaram no sentido de
perguntar quais são as ações que a SEPPIR tem feito para reverter
esse quadro de discriminação. Vejam, as ações elas visam
principalmente fazer chegar à sociedade como um todo mas
principalmente à gestão pública aos organismos governamentais a
compreensão, o entendimento de que há um legal de promoção da
igualdade racial no Brasil considerável. Só que esse marco legal
que traz a nossa condição e igualdade – mulheres negras e
mulheres brancas – ele ainda nos apresenta um desafio quanto a sua
real efetivação. Isso nos traz: que necessidades, que estratégias,
que ações deveremos estar trabalhando? Ora, no campo da reversão
desse imaginário negativo. Então, a campanha “Igualdade
Racial é para Valer”,
ela foi lançada em março desse ano, nós estamos no Ano
Internacional dos Afro-descendentes, encampado pelas Nações Unidas.
Então vimos que uma campanha voltada para promover esta igualdade
ela tem como objetivo fazer com que a sociedade reflita sobre o lugar
que essa população negra ainda tem no conjunto dos indicadores
sociais, e dentre eles as mulheres negras, que apresentam para o
conjunto de pesquisas o lugar onde ela agrega as famílias mais
pobres, mulher negra agrega as famílias com maior número de
crianças, maior número de adolescentes. E, com o crescimento de
famílias chefiadas por mulheres no Brasil, essas mulheres negras
também engrossam esses percentuais, mas ao mesmo tempo apresentam
uma concentração de famílias pobres. E a gente sabe das
repercussões disso para a vida familiar mas não é esta a tônica
com a qual estamos trabalhando. Então a Campanha “Igualdade Racial
é para Valer”, como ela está acontecendo: nós estamos
trabalhando com Ministérios, Fundações, Municípios, Estados, no
sentido de estimular principalmente o poder público para sua adesão
à campanha, mediante um plano de ação, mediante um protocolo de
intenções, para que possam vir a desenvolver ações que revertam
essas desigualdades, essas discriminações.
Recentemente,
a SEPPIR, no dia 27 de outubro, firmou um protocolo de intenções
com o Ministério da Saúde, e a saúde é uma das dimensões onde
essa desigualdade, no caso da saúde da mulher negra, aparece de
forma muito evidente, então são muito importantes essas ações
que a gente está firmando com o Ministério da Saúde e com diversas
outras organizações. Mas, trazendo para o campo da Cultura, há
dois meses atrás houve um Seminário com a Assessoria de Comunicação
da Presidência da República, junto com a SEPPIR, no sentido de
discutir como a Assessoria de Comunicação incorpora a dimensão
racial na publicidade. E isso está dentro de um dos objetivos do PPA
que é exatamente o de reverter essas representações, tendo na
administração pública federal um parceiro. Então, na verdade nós
estamos inciando um processo de informação, de discussão, a
receptividade tem sido muito boa, porque a administração pública
federal, no conjunto das campanhas, como é que ela dá visibilidade
a essa realidade, à participação das mulheres negras, da juventude
e dos homens negros. E, também, recentemente na semana passada nós
participamos com apoio no 8ª Edição do Seminário
Mulher e Mídia,
que tem sido organizado pelo Instituto Patrícia Galvão, em São
Paulo, com um conjunto de outras organizações. O Seminário tem-se
dado anualmente no Rio de Janeiro. Ele tem possibilitado a discussão
entre os vários movimentos de mulheres e governo quais têm sido as
políticas no campo da comunicação com potencial de reversão dessa
imagem negativa.
O
que eu queria ressaltar é que, na medida em que nós temos no
Ministério Público, no campo das instituições voltadas para a
defesa dos direitos humanos, e a defesa dos direitos da população
negra, tem sido fundamental essa ação em parceria. Eu estou vendo
aqui a companheira Bernadete, lá de Pernambuco, nós atuamos juntas
durante um bom período, eu venho também daquela terra, e nós
identificamos a grande importância que têm tido os ministérios
públicos, tanto no processo de identificação do racismo, nas
tentativas de se transformar racismo em injúria, e muitas vezes
casos que a população traz como racismo acabam se
descaracterizando, então tem sido muito importante a ação do
Ministério Público no sentido de sensibilizar e de formar os seus
profissionais. E ao mesmo tempo, enquanto governo federal, enquanto
SEPPIR, a gente se coloca à disposição para conversar com vocês,
para estarmos fortalecendo essas ações, porque o nosso compromisso
tem sido exatamente o de fazer com que as mulheres negras, pela
participação que elas têm na história dessa sociedade, na
construção da riqueza nacional, na construção dos pilares que
moldam a nossa sociedade do ponto de vista da cultura, da organização
familiar, essas mulheres precisam ganhar o seu reconhecimento, elas
precisam ter a sua dignidade assegurada, sob pena de reproduzirmos a
desumanização.
25.
A Procuradora Federal dos Direitos do Cidadão, Dra Gilda carvalho,
agradece
a expositora e convida a procuradora da República Márcia Morgado
para expor o tema da atuação cível pelo direito das mulheres à
não discriminação na programação televisiva.
26.
Exposição: Atuação cível pelo direito das mulheres à não
discriminação na programação televisiva – MPF - Dr ª Márcia
Morgado – PR/RJ.
Primeiro dizer
da relevância desse evento que é sempre um aprendizado, uma
capacitação como membro do Ministério Público, e seguindo o que
foi falado pela professora Malvina, devemos nos unir e avançar
porque leis efetivamente não faltam. Então, pelo tema que me foi
passado, eu vou falar da atuação
cível pelo direito das mulheres à não discriminação na
programação
televisiva
e vou dar alguns exemplos de atuação do Ministério Público
Federal.
Primeiramente,
eu vou apresentar o Grupo de Trabalho “Comunicação Social”. A
PFDC abrange vários temas, então determinou-se pela criação de
grupos de trabalho, e um dos temas, por ter sido considerado
prioritário, é a comunicação social, e nós
atuamos desde 2004. Eu atualmente
como Coordenadora, o colega Marcus Vinícius Aguiar
Macedo,
do Rio Grande do Sul (PRR – 4ª Região), o colega Fernando de
Almeida Martins, de Minas Gerais, como suplente o colega Luiz
Fernando Gaspar Costa, de São Paulo e hoje em dia há uma vaga em
razão de que o colega Domingos foi nomeado ao cargo de Ouvidor
nacional dos Direitos Humanos em Agosto de 2011.
O
GT Comunicação Social foi criado em 2004, e visa auxiliar a PFDC na
atuação relativa a diversos temas da comunicação social. É
importante saber que não é um órgão de execução, é um grupo
que auxilia a PFDC e também faz encaminhamentos das representações
recebidas aos colegas que vão ter atribuição no caso. Nossa
atuação também não é exclusiva nesse grupo de trabalho, cada uma
tem sua atuação nos seus respectivos Estados, mas a importância
desse grupo é porque também realizamos parceria relativas ao tema
Comunicação Social que facilitam a atuação dos colegas na ponta
e também a atuação da Procuradoria Federal dos Direitos do
Cidadão, no tema comunicação social. Nesse sentido a gente pode
exemplificar a parceria com o DEJUS, Departamento de Justiça e
Classificação Indicativa, que atua muito com reuniões e estão
sempre acompanhando a questão da classificação indicativa, e
também o Conselho Federal de Psicologia, Ministérios Públicos de
Estados, então realmente conseguimos com esse trabalho um avanço no
acompanhamento da política pública da comunicação social.
Entrando
no tema Programa
Televisiva,
eu fiz questão de colocar esse tópico, porque é importante uma
conscientização de todos de que a concessão do serviço de
radiodifusão é um serviço público federal, não é um serviço
privado, então não é um favor o cumprimento de das leis e normas
relativas a esse tema, é uma obrigação, efetivamente, das empresas
que são concessionárias. E nesse caso, tanto o poder executivo
quanto o legislativo têm a sua responsabilidade nessa concessão
desse serviço. E é importante destacar o Artigo 221, porque é nele
que consta o conteúdo que se pretende na programação televisiva,
que é relativo às finalidades educativas, à regionalização da
produção cultural,
a produção de cultura nacional e regional e o respeito aos
valores éticos e sociais da pessoa e da família, isso está na
Constituição Federal.
Eu
queria passar para vocês as possibilidades de atuação cível do
Ministério Público, no caso destaquei o Ministério Público
Federal. Recebida uma Representação ou tendo-se conhecimento de uma
notícia relativa, no caso, a comunicação social, pode haver a
instauração de um Procedimento Administrativo ou um Inquérito
Civil Público, em que vão ser expedidos ofícios, colhidas as
provas relativas àquele fato que foi noticiado. Pode ser expedida
uma Recomendação, que neste caso vai buscar sustar aquela situação
considerada discriminatória ou aquele ato não condizente com a
legislação; um Termo de Ajustamento de Conduta, em que a emissora
comprometa a não continuar a prática daquela conduta considerada
irregular, e também a propositura de Ação Civil Pública. Nessas
Ações Civis Públicas, o que podemos pedir: que aquele programa
seja suspenso, que aquele quadro de um determinado programa seja
sustado, que aja uma contrapropaganda àquela lesão que foi
divulgada, dano moral coletivo - e aí é importante a concepção
que nós defendemos do dano moral coletivo, de que uma vez constatada
essa violação, à legislação a um valor considerado fundamental à
sociedade, esse dano não é necessário uma prova mais detalhada,
uma prova individualizada dele, e muitas vezes não há esse
entendimento e essa compreensão pelo judiciário. E não comprovada
nenhuma irregularidade, encaminha-se ao arquivamento, que sempre é
submetido à PFDC, Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão,
para fins de homologação ou não.
Eu
começo a citar alguns exemplos que entendi mais relevantes para o
tema de hoje, com o exemplo do Big
Brother Brasil, que antes de iniciar este último
programa, de janeiro do presente ano, a PFDC já recebeu inúmeras
representações, já preventivamente, a sociedade já preocupada com
as possíveis violações que aquele programa poderia trazer. Como
GT, fizemos reunião com a emissora, com os representantes e a PFDC
expediu uma Recomendação, antes da veiculação do Programa, dentre
os quesitos da Recomendação estava um que era da adoção das
medidas preventivas para evitar veiculação de violações a
direitos humanos. Como eu no Rio de Janeiro sou a Procuradora que tem
atribuição para esse caso, instaurei um procedimento de
acompanhamento do cumprimento dessa Recomendação e, ao final do
Programa, pela análise do DEJUS e todo o monitoramento do
departamento do Ministério da Justiça, verificou-se que não foi
constatada uma violação nesse aspecto e nem descumprimento da
Recomendação, o que gerou o arquivamento do procedimento.
Ação
Civil Pública MPF (PR/SP) – em parceria com a sociedade civil –
em face da REDE TV, do apresentador João Kleber e da União– ano
2005 – Programas “Tarde Quente” e “Eu Vi na TV”. Outro
exemplo que entendo como um marco na atuação relativa à
discriminação, foi a do colega de São Paulo, Sérgio Suiama, no
ano de 2005, relativa ao “Programa Tardes Quentes” e ao “Eu Vi
na TV”, de João Kleber, vocês devem ter ouvido falar, em que
foram constatadas graves violações a direitos humanos e dentre
essas discriminações e ofensas a mulheres, as mulheres eram
agredidas pelos namorados, havia o teste de fidelidade, haviam
pegadinhas. Foi pedida nessa ação a exibição de contrapropaganda,
dano moral coletivo, que se abstivessem de exibir esse tipo de
situação no programa, e a liminar foi concedida. Eu achei tão
relevante que eu transcrevi um trecho que representava a síntese do
que acontece nesses programas:
Liminar:
“(...) Não
se trata de humor lúdico, mas visa alcançar o riso daquele que o
assiste através do escárnio. Escárnio, no Dicionário Aurélio,
remete ao verbete “zombaria”, que tem como definição a
“manifestação intencional, malévola, irônica ou maliciosa, por
meio do riso, de palavras, atitudes ou gestos, com que se procura
levar ao ridículo ou expor ao desdém ou menosprezo uma pessoa,
instituição, coisa, etc., e até sentimentos...” “Tal escárnio
é efetuado principalmente através da adoção de atitudes
claramente depreciativas, preconceituosas e deturpadas de
estereótipos de minorias, tais como homossexuais, idosos, mulheres,
deficientes físicos e crianças...”.
Essa liminar
foi realmente um marco, porque foi acatada a imposição da
contrapropaganda. O que aconteceu: a emissora não cumpriu a liminar,
foi determinado o corte do sinal de transmissão e ai sim,
conseguiu-se um acordo judicial, que o Ministério Público firmou
junto à emissora em Juízo, em que foi determinada a
contrapropaganda, houve, se não me engano, trinta programas, sobre
a não discriminação, pagos pela emissora, ficou estabelecida uma
verba de indenização, de pagamento de dano moral, então foi um
grande êxito que nós verificamos nessa questão da comunicação
social, porque nem sempre conseguimos êxito com a propositura de
ações civis públicas.
Ação
Civil Pública (PR/SP) - em face da Rede TV e União – ano 2009 –
Programa “Superpop”.
Outro exemplo, de 2009, a colega Eugênia
Fávero, em São Paulo, programa “Super Pop”, Rede TV e União.
Eu gostaria que vocês reparassem que também na anterior, relativa
ao programa de João Kleber, a União também consta como Ré. Nesse
programa também foi constatado conteúdo discriminatório em relação
à mulher e banalização de sua imagem. Um dos quadros é um desfile
de lingerie e fica nítido que a lingerie não é a finalidade do
programa, com comentários totalmente discriminatórios a mulher.
Este caso encontra-se ainda em instrução, na fase de produção de
provas.
Inquérito
Civil Público – MPF (PR/SP) – ano 2010 – sobre campanhas
publicitárias de cunho racista e sexista – Cervejaria
Devassa/Schincariol. Esse
exemplo também muito interessante, do colega Jefferson Aparecido
Dias, de São Paulo, ano de 2010, relativo a campanhas publicitárias
de cunho racista e sexista da cervejaria Devassa, do Grupo
Schincariol. Foi feita uma reunião pelo colega em São Paulo com a
empresa e os Representantes, que são o “Observatório Negro”, o
“Com Negras” e estabeleceu-se a realização de dois seminários,
um em São Paulo e um em Recife, para que juntos chegassem a uma
conclusão do que seria para a melhoria disso, nesse meio tempo
também foi juntada uma publicidade que o grupo fez na Veja pelo dia
da Consciência Negra, e agora encontra-se em fase de manifestação,
vai ser expedido um ofício para o Observatório Negro se manifestar
sobre estes seminários que ocorreram. Então é uma via interessante
de atuação, porque acho que é com isso que se consegue construir e
avançar; a conscientização e uma congregação de esforços que
vai resultar com certeza num ponto positivo, nesse aspecto.
Ação
Civil Pública MPF (PR/RJ) em face da Globo – ano 2005 – Novela A
Lua Me Disse. Esse
exemplo é de uma ação que eu propus no Rio de Janeiro, em 2005,
relativo a novela A Lua Me Disse. Havia tanto o descumprimento da
classificação indicativa quanto a questão etária e horária, mas
também o conteúdo discriminatório dos povos indígenas, uma
personagem mulher, que era uma empregada doméstica, que sofria
diariamente um reiterado tratamento constrangedor, preconceituoso,
pela sua característica, sua etnia como indígena. Nós recebemos
dois laudos antropológicos de analistas periciais do Ministério
Público Federal que reiteraram e deixaram constatada essa
discriminação, propusemos a ação, conseguimos liminar, mas foi
cassada no tribunal, que era justamente para não houvesse esse tipo
de situação em relação à personagem e também que fosse
vinculada uma mensagem ao final de cada capítulo relativa ao fato.
Mas foi cassada no tribunal, o Juiz deu a sentença pela
improcedência por falta de provas sem ter aberto prazo para provas,
daí eu recorri, o tribunal anulou a sentença e agora estamos em
fase de provas. Na verdade, no nosso entendimento, o dano moral
coletivo não necessita de perícia, nesse caso isso foi uma situação
em que teve que ser pedida porque já de plano o juiz entendeu que
não haveria prova e julgou improcedente, então ela está em fase de
perícia antropológica e de psicologia.
ACP
MPF (PR/RJ) em face da Globo – ano 2006 – novela Cobras e
Lagartos. A
Novela Cobras e lagartos também foi uma ação que foi proposta no
Rio de Janeiro, era mais o enfoque da classificação indicativa mas
também havia um conteúdo discriminatório, também foi julgada
improcedente por não comprovação do dano moral coletivo, já com
acórdão transitado em julgado. É importante ressaltar que eu estou
mencionando ações de cunho discriminatório, mas há diversas ações
pelo país, do Ministério Público Federal, relativas também ao
descumprimento da classificação indicativa e descumprimento de fuso
horário pelas emissoras. Mas como o tema não era esse eu me ative a
esses exemplos.
Ação
Civil Pública MPF (PR/DF) e sociedade civil – em face da Globo –
ano 2006 – Programa Zorra Total. Coloquei
um exemplo de discriminação a homossexuais, uma ação proposta em
Brasília, em 2006, pelo programa Zorra Total ter quadros de
estereótipos e incitação à violência a homossexuais, mas pelo
andamento recente foi julgada improcedente e está em fase de
apelação.
Ação
Civil Pública MPF (PR/SP) e sociedade civil – em face da
Record/Rede Mulher – ano 2004 – programas religiosos com enfoques
negativos sobre religiões de matriz africana, com cunho
discriminatório. Uma
outra ação civil pública foi proposta pela colega Eugênia em São
Paulo, relativa a programas religiosos com enfoques negativos sobre
religiões de matriz africana, com cunho discriminatório. Essa ação
teve um desfecho muito diferente dos outros, houve a exclusão da
União e remessa a uma das varas Criminais da Justiça Estadual. Eu
conversei com a colega Eugênia, foi por ter-se entendido se tratar
de uma empresa privada. Então é um desfecho não comum nos nossos
pleitos judiciais.
Termo
de Ajustamento de Conduta MPF (PR/SP) com a Record – ano 2009. Um
outro exemplo
interessante é um Termo de Ajustamento de Conduta, porque nem sempre
as emissoras se dispõem a assinar um termo de ajustamento de
conduta. Assinado em São Paulo no ano de 2009, isso foi por causa da
exposição de uma criança com leucemia num determinado programa,
por trinta minutos. Dentre as cláusulas do acordo ficou a observação
da não discriminação em razão de etnia, raça e etc.
INTERNET.
Achei
relevante citar também alguns exemplos na internet, porque hoje a
programação televisiva talvez seja uma das mídias que a criança e
o adolescente talvez menos assistam hoje em dia. Então a internet
está na ordem do dia. Os MPF em São Paulo e no Rio de Janeiro
fizeram termos de compromisso de integração operacional com
provedores dos seus respectivos estados que concordaram em assinar.
Nesses termos, a importância é que eles se comprometem a avisar os
usuários que não podem se utilizar dos sítios eletrônicos para
fins de discriminação, tem toda uma conscientização sobre isso,
no contrato, também, quando há essa habilitação para o uso do
provedor há essa informação e também os provedores se comprometem
a informar o Ministério Público Federal sobre as notícias que
recebam de situações discriminatórias veiculadas pela internet.
Também
vem sendo organizados pelo Ministério Público Federal junto com a
ONG SAFERNET, em São Paulo e no Rio de Janeiro, oficinas que visam
capacitar educadores de escolas públicas ou privadas, para que
possam repassar aos seus alunos a importância do comportamento que
eles devem ter na internet, tanto para fins de proteção, mas também
para que saibam que discriminação é crime, que eles não podem
escrever o que querem na internet, hoje tem a questão do bullying
mais forte do que nunca, por causa da internet, então é um trabalho
preventivo, é um trabalho que estamos tentando fomentar em termos de
educação e que acho que vai dar bons frutos pelo que nós temos
visto do interesse dos educadores nessas oficinas.
Avanços
Necessários. O
que coloquei, resumidamente, como avanços necessários, obviamente
não se esgotam nisso, mas achei que são os mais relevantes para
falar aqui hoje:
- Efetivação da fiscalização do cumprimento da legislação quanto à não discriminação pelas concessionárias de serviço público, a ser feito pela União, no caso, o Ministério das Comunicações.
O
que acontece: hoje, o DEJUS, que é o Departamento de Justiça e
Classificação Indicativa do Ministério da Justiça, faz um
excelente trabalho desse monitoramento, mas a atribuição deles é
relativa à classificação indicativa, etária e a horária. Mas,
nessa análise do monitoramento, eles também fazem constatações,
se houve um tratamento degradante, humilhante, eles sinalizam, apesar
de não ser atribuição deles essa questão. Então, nós entendemos
isso como um material extremamente relevante, para que o Ministério
das Comunicações use disso, para que possa, dentro de sua
atribuição, que é a Secretaria de Comunicação Eletrônica,
efetuar o controle do artigo 221 da Constituição Federal. O
que nós observamos hoje é que o artigo 221 está praticamente uma
letra morta, porque quando não há uma ação judicial, uma atuação
do Ministério Público, não se vê, pelo poder público, uma
atuação que nos encaminhe aquilo, a não ser o DEJUS, porque
realmente eles realmente têm uma atuação em parceria com o
Ministério Público Federal. Então eu lamento hoje a ausência de
representante do Ministério das Comunicações, apesar de convidado,
porque eu acho que é a ponta que falta para que se possa fazer o
quê, qual a relevância disso, porque temos ações, a União também
consta como Ré – recentemente numa outra ação que eu propus a
União até disse que não tinha interesse na ação-, então é
importante que se entenda que é um serviço público federal, é uma
concessão, não está solta no mundo. E com esse trabalho o que
seria relevante e que nós pelo GT tentamos implementar e ainda não
conseguimos: um fluxo DEJUS/Ministério das Comunicações, para
receber esse material e a partir dai instaurar os seus procedimentos
administrativos e poder aplicar as penalidades administrativas ou
encaminhar para penalidade judicial, que é a questão da cassação
da concessão. Ou, mais relevante ainda, para que no momento da
renovação da concessão, tenha-se um histórico daquela emissora,
relativo a essas violações, para que possa não haver uma
renovação automática, mas sim uma renovação com consciência, e
com isso certamente as emissoras passariam a ter muito mais cuidado
na veiculação de determinados conteúdos. Então é isso que eu
acho que está hoje faltando, e isso está na pauta do GT como uma
persistente atuação para que possamos avançar nisso e o auxílio
da sociedade e dos órgãos que têm interesse no tema seria muito
relevante, para a gente poder atuar em conjunto.
- A ativação do Conselho de Comunicação Social
A
ativação do Conselho de Comunicação Social seria também um ponto
extremamente relevante, porque também faria esse papel do controle
social na renovação da concessão. Apesar de previsto na
Constituição Federal e da Legislação, ele não está … e hoje
tramita um requerimento da Deputada Luiza Erundina, perante a
Procuradoria Geral da República, justamente uma Representação para
que haja essa implementação do Conselho, no Congresso Nacional.
- Educação
É
óbvio que não se pode falar em comunicação social e de mudança
sem que falemos em educação. Claro está que não podemos deixar as
emissoras, a comunicação social como um todo, livre e sem cumprir o
seu dever previsto na legislação, porque a comunicação social
impõe padrões de comportamento, impõe padrões de imagem, que são
ás vezes maléficos para a crianças e adolescentes que não têm a
consciência. Agora, é óbvio que as emissoras se pautam na
audiência, à medida que consigamos construir cidadãos que não
deem audiência, não sirvam de “plateia” para esse tipo de
programação, é óbvio que, com o tempo, esperamos que isso se
dilua, e as próprias emissoras vão acabar revendo esse contexto.
Falou-se
muito da lei 10. 639, é um tema que nós temos atuação no
Rio de Janeiro em relação a escolas federais, estamos atuando com o
Ministério Público Estadual, que está tratando das demais escolas
e a ideia é fazer uma audiência pública ou um seminário sobre
isso para que possamos evoluir. O MEC, nas demandas que eu fiz, eu
achei que teve um crescimento na avaliação do que as escolas vinham
fazendo e acho que o MEC pode nos auxiliar nessa capacitação, que
às vezes a própria escola não sabe como cumprir. Foi, na minha
experiência, o que eu cheguei à conclusão e acho que nós podemos
auxiliar nesse sentido.
Então,
é resumidamente isso que eu gostaria de passar para os/as
senhores/as e acho que é importante essa união de esforços
Ministério Público, Poder Público Federal e Sociedade Civil.
27.
A PFDC agradece
a exposição da colega Dra Márcia Morgado, procuradora dos Direitos
do Cidadão no Estado do Rio de Janeiro e convida a procuradora de
Justiça, coordenadora do GT Racismo/Pernambuco, Dra Maria Bernadete
de Azevedo Figueiroa, para sobre a experiência do GT Racismo em
Pernambuco.
28.
Exposição: A experiência do GT Racismo do Ministério Público de
Pernambuco
- Maria Bernadete M. de Azevedo Figueiroa - Procuradora de Justiça –
MPE/PE. Coordenadora
do GT - Racismo
Boa tarde a
todas e a todos. Quero em primeiro lugar reiterar em público meu
agradecimento ao convite formulado pela minha querida colega Gilda
Carvalho, de fazer esta interface com tantas instituições, por
intermédio do Ministério Público Federal, e agradecer a estas
pessoas que heroicamente estão resistindo para continuar aqui
contribuindo, é um agradecimento fundamental, essas pessoas que
ainda conseguem permanecer aqui nos escutando, e agradecer também
aquelas que saíram porque tiveram necessidade, é evidente.
Quando a Dra
Gilda me convidou para essa Audiência Pública, eu fiz questão de
falar para ela que esse trabalho do GT Racismo, embora ele faça o
recorte de gênero, mas o enfoque mais constante, mais contínuo é
em relação à questão racial mesmo. Mas, como se trata de uma
Audiência Pública, e nós estamos finalizando essa Audiência, que
se propõe justamente a ouvir as instituições governamentais, não
governamentais, os movimentos sociais, e aqui compareceram
representantes do movimento negro, representantes da sociedade civil
de um modo geral, das mulheres, então eu acho que esse momento é um
momento importante para pensarmos no quão a gente pode subsidiar o
Ministério Público Brasileiro, para implementar essas discussões
que estão sendo formuladas e discutidas.
Eu gosto de
trazer à tona sempre a legislação que inaugurou o marco legal
brasileiro com relação às questões raciais, que é a Convenção
Internacional Sobre a Eliminação de Todas as Formas de
Discriminação Racial,
de 1965 (21.12.65),
ratificada pelo Brasil 1968 (27.03.68), que traz o conceito de
Discriminação como:
“Significa
qualquer distinção, exclusão, restrição ou preferência baseada
na raça, cor, ascendência, origem étnica ou nacional com a
finalidade ou efeito de impedir ou dificultar o reconhecimento e/ou
exercício, em bases de igualdade, aos direitos humanos e liberdades
fundamentais nos campos político, econômico social, cultural ou
qualquer outra área da vida publica.”
É sempre bom a
gente recortar essa legislação, porque, principalmente para nós
operadores do direito, e para a sociedade como um todo, é bom que se
saiba que toda essa discussão ela tem um substrato legal, ela tem um
fortalecimento institucional da ordem jurídica brasileira,
incorporada através de vários instrumentos legais, que possibilita
essa discussão. Então é importante saber que a lei existe porque
ela é um instrumento legal que pode ser utilizado inclusive pelo
cidadão. Porque a gente não caiu de paraquedas aqui, não é porque
de repente todo mundo resolveu se sensibilizar com a população
negra. É porque existe toda uma história que foi construída pelo
movimento social negro do Brasil e do mundo, e que hoje repercute
favoravelmente a todas essas ações.
Na esteira das
legislações internacionais, relembrando aqui a II
Conferência Mundial Contra o Racismo, a Xenofobia, a Discriminação
Racial e Formas Correlatas de Intolerância,
realizada em Durban, de 2001, na África
do Sul, e a Declaração Facultativa
à Convenção, que o Brasil assinou
também, de 2003 (12.06.2003), reconhecendo a competência do Comitê
Internacional para a Eliminação da Discriminação Racial, para
receber, analisar e processar denúncias contra violação de
direitos humanos. Inclusive o que possibilitou aquela ação da
Simone lá de São Paulo, que o Brasil foi condenado pela Corte
Interamericana de Direitos Humanos por Discriminação pelas
instituições brasileiras, e leia-se Ministério Público,
Magistratura e Polícia, que não deram o devido encaminhamento à
violação discriminatória sofrida por aquela cidadã de São Paulo.
Eu
trago à tona também, porque eu acho que foi muito falado aqui e é
fundamental que se pense nessa lei como um instrumento fundamental
e básico para se trabalhar o racismo brasileiro, a Lei
10.639, de 09 de janeiro de 2003
– que estabelece a obrigatoriedade do ensino da História e
Cultura Afro-brasileira e Africana, porque alterou a Lei de
Diretrizes e Bases - LDB (Lei n. 9394/96). E
Lei 11645/08 que
inclui a cultura indígena. Então essa lei, o movimento negro do
Brasil coloca como uma ação fundamental para que transforme as
relações raciais no Brasil, não apenas pela questão da
abordagem teórica, de conteúdo de ensino, mas também porque
possibilita a discussão das relações raciais, do reconhecimento
de uma identidade, do pertencimento e da história de cada cidadão
e cidadã afrodescendente.
Então,
como já foi dito aqui, não obstante a existência desse aparato
legal favorável à garantia do direito à saúde, à educação, a
uma série de direitos que são assegurados por nossa legislação,
em face da cristalização de valores e práticas individuais e
institucionais, essas práticas dificultam a implementação de
políticas afirmativas para a população negra no Brasil. E quando
eu falo em práticas institucionais eu me refiro, eu estou aqui
fazendo um recorte também bem específico em relação ao sistema de
justiça e segurança, porque nós somos primordialmente os agentes
políticos, agentes públicos encarregados de implementar as leis,
daí a grande responsabilidade do Ministério Público Brasileiro, da
Magistratura, do Sistema de Justiça e Segurança como um todo. Eu
não vou repetir as atribuições do Ministério Público, que está
na Constituição.
Eu
estou aqui para trazer essa experiência do que tem sido esse
trabalho do GT Racismo. Então eu coloquei a pergunta: porque a
criação de grupo de combate a racismo no âmbito do Ministério
Público, que existe desde 2002, por ato do Procurador-Geral
(Portaria PGJ nº 542/2002 - MP/PE). Inicialmente foi percebida a
grande dificuldade dos colegas se darem conta do dano grave, da grave
violação de direitos que é o racismo. Então foi preciso que se
fizesse uma discussão para que o Ministério Público de Pernambuco
- eu falo de um modo coletivo, mas individualmente, principalmente os
promotores que estão na ponta , na cidadania – percebesse que isso
era uma violação de direitos grave, que precisava ser enfrentada.
Por que como temos inúmeras e diversas atribuições, isso sempre
era visto como uma coisa que estava em último lugar, uma atuação
menos importante ou quase que desnecessária, porque “o racismo não
existe”, entre aspas, nós somos uma “democracia racial” e o
Ministério Público não tem que se preocupar com uma “coisa que
não existe”, que é o racismo brasileiro. Daí a discussão ter
sido necessária.
Então
foi preciso discutir o Racismo Institucional; a necessidade
de ver, admitir, capacitar; estimular os integrantes do MP/PE a
definir estratégias de atuação e buscar soluções para promover a
inclusão social e econômica; estudar
a formulação e fazer o acompanhamento da execução de políticas
de ação afirmativa. Então, dentro dessa perspectiva, o GT Racismo
vem desenvolvendo ao longo desses quase nove anos de trabalho – vai
completar, no dia dez de dezembro, nove anos - nós temos realizado
muitas ações com esse desiderato. E é bom que se diga, como Márcia
realçou, o GT Racismo, eu costumo dizer que é um “bico” dentro
do Ministério Público, porque a gente tem tantas atribuições,
cada um na sua área, temos que arrumar um tempo para fazer este
trabalho, porque é uma coisa que a gente tem que fazer. Porque além
de ser o dever da gente, temos que fazer esse olhar, e trazer as
pessoas para junto para dar essa sequencia, porque é o nosso papel
institucional. Mas é quase como uma missão, porque é tão difícil
minha gente, é tão difícil trabalhar racismo, é tão difícil que
é como uma missão. E eu me lembro de Ariano Suassuna quando ele diz
assim: “o que é ruim de passar é bom de contar”. É o nosso
querido Ariano, lá de Pernambuco. O que é ruim de passar é porque
é difícil mesmo, então a gente conta, é tão bonito, a criação
do GT, mas é uma história de muito trabalho mesmo. Mesmo porque,
quem for fazer tem que enfrentar, tem que encarar os obstáculos, que
são inúmeros, até hoje é assim. Claro que nós lá já nos
consideramos no melhor dos mundos, em relação ao que começou.
Temos um universo já de mais de 150 promotores que passaram por
capacitações e sensibilização, que já avançaram muito nessa
discussão, hoje em dia no Ministério Público de Pernambuco todo
mundo sabe o que é racismo, que ele existe - porque tem muita gente
que não sabe – que é preciso ser enfrentado, que é preciso que
as pessoas denunciem.
Ações
do GT Racismo:
- Realização de Audiências Públicas com a participação do Movimento Social Negro – desde o início e até hoje - e das demais instituições do Sistema de Justiça e Segurança;
- Criação de Grupo de Estudo sobre a temática racial;
Nós
nos reunimos sistematicamente. Atualmente estamos debruçados sobre o
Estatuto da Igualdade racial, para que possamos nos aprofundar,
discuti-lo e implementá-lo com mais propriedade;
- Realização de eventos pelo MP em todas as datas significativas para o combate ao racismo
Nós
não perdemos nenhuma dificuldade de fazer um evento, focado na
discussão racial, como por exemplo caminhada no Dia da Consciência
Negra, inúmeros seminários, recentemente tivemos contação de
história africana para as crianças das escolas públicas e os
filhos dos funcionários, na biblioteca do Ministério Público, foi
lindo, um dia dentro das comemorações no mês da Consciência
Negra. Organizamos também o lançamento dessa campanha de combate
aos crimes de racismo, no dia 4 de novembro, abrindo as comemorações
do Mês da Consciência Negra no Ministério Público, inclusive com
a presença da Ministra Luiza Barrios. Essa campanha de combate aos
crimes de racismo foi construída desde o início e teve a
participação constante da Polícia Civil e a Militar, que já tem
também um GT Racismo criado com esse propósito, então foi feita
uma construção em conjunto porque nós sabemos que não adianta
fazer a nossa parte se não vier o encaminhamento correto da polícia,
por exemplo. Porque se não vier o inquérito já próprio, se virar
TCO (Termo Circunstanciado de Ocorrência) de início, e ao TCO não
se der o encaminhamento, enfim foi feito um trabalho em conjunto e
vai continuar sendo feita essa parceria com a Polícia Militar em
relação aos crimes de racismo.
- Realização de oficinas de sensibilização com membros e servidores do MPPE em parceria com PNUD (2006) e SEPIR (2010) ;
Fizemos
quatro oficinas o ano passado em várias regiões do Estado de
Pernambuco.
- Formação de plano de atuação por Promotoria de Justiça, com fixação de ações e metas;
Isso surgiu a partir das oficinas de 2010, foi muito
interessante, os promotores mesmos apresentaram propostas de como
implementar a lei, como enfrentar o crime de racismo, como trabalhar
as comunidades quilombolas, temos mais de cem comunidades quilombolas
no nosso Estado. Realizamos inclusive Audiência Pública em Agosto
de 2009 com mais de cem lideranças quilombolas – todas as
lideranças quilombolas do Estado de Pernambuco estavam presentes
nessa Audiência Pública, tivemos até a presença de dois
procuradores da República da região de Serra Talhada - e foi
riquíssima essa construção, houve muitas continuidades dessa
Audiência Pública, do que foi posto pelas lideranças, através
dos promotores da região.
- Interface com o Movimento Negro e gestores públicos (saúde, educação, defesa social);
- Suporte técnico para os Promotores de Justiça.
Porque,
também lembrando o que Márcia falou, o GT não é um órgão de
execução, ele é um órgão de coordenação e acompanhamento, ele
subsidia os promotores nas promotorias onde eles estão sobre as
questões raciais. Somos muito solicitados, por sinal, para dar esse
aporte, devido às inúmeras atribuições que cada um tem e às
especificidades da questão racial.
Ações das Promotorias de
Justiça ( ações de execução)
- Intervenção para concessão de aposentadoria dos quilombolas como trabalhadores rurais;
Foi uma ação muito
interessante. Eles não tinham direito à aposentadoria porque não
eram considerados trabalhadores rurais, porque não tinham carteira
assinada e nem tinham a propriedade da terra, dai a grande
dificuldade, foi conseguido através de diálogo com o próprio INSS,
foi baixada uma Resolução que acabou possibilitando esta
aposentadoria dos quilombolas.
- Intervenção para implantação de PSF's (programa saúde da família) nas comunidades quilombolas, onde não existia;
- Intervenção para garantia de direitos fundamentais mínimos como acesso à água;
Porque em algumas comunidades
do sertão de Pernambuco não tinha nem água potável.
- Intervenção para promover a regularização fundiária;
Intervenção em interface,
junto com o Ministério Público Federal, pois a atribuição é do
MPF.
- Intervenção para garantir a liberdade religiosa;
- Realização de campanhas institucionais (de combate ao racismo institucional, de enfrentamento à impunidade nos crimes de racismo);
- Participação nos Congressos estaduais e nacionais do Ministério Público com teses sobre o tema racial;
- Incentivo à criação de GT-Racismo em outras instituições governamentais (Polícias Civil e Militar);
- Inserção do enfrentamento ao Racismo Institucional no Planejamento Estratégico do MPPE.
Eu
deletei alguns slides para apressar o tempo, mas ficou um assunto
que gostaria de refletir que é a questão da mortalidade da
juventude negra. Pernambuco tem um programa que chama “Pacto pela
Vida”, e de 2008 para cá vem caindo o número de homicídios em
Pernambuco, embora nesses dois últimos meses tenha aumentado um
pouco, mas sempre em relação à população branca, e aumentado
sistematicamente em relação à população negra. E isso não é
só em Pernambuco, estou trazendo os dados do meu Estado.
Então, o plenário do Conselho Nacional de Segurança Pública
divulgou recentemente, com base no Mapa da Violência de 2011,
mostrando, por exemplo que, em Pernambuco, em 2008 foram
assassinados 126% de mais jovens negros do que brancos, e isso está
acontecendo no Brasil todo, uma Recomendação.
Essa
Recomendação,
em face desses resultados, reconhece como grave a situação da
segurança pública no país, tendo como emblemática o crescente
número de homicídios e
encarceramento
dos jovens negros, apontando de modo inequívoco, para as raízes
socioeconômicas e étnico-raciais dessa realidade, como resultado do
racismo histórico que a sociedade brasileira inflige a esse
segmento. Leva em consideração que a probabilidade de morte de um
negro, entre 15 e 24 anos, é de 127,6% maior do que a de um branco
na mesma faixa etária. Recomenda que sejam instituídos, no prazo de
30 dias –
eu não sei se foi instituído, mas não me consta, foi uma
Recomendação de 2011 do Conselho Nacional de Segurança Pública -
, mecanismos do tipo agenda conjunta, (Ministério das Justiça,
SEPPIR, Secretaria Nacional da Juventude, Comissão de Segurança
Pública da Câmara dos Deputados, etc) visando a busca de soluções
e definição de responsabilidades setoriais em relação a políticas
públicas de combate a violência letal contra a juventude negra.
E
não me consta que tenha havido manifestação nesse sentido. É isso
que eu gostaria de lembrar aqui, a gente precisa saber o que foi
feito com essa recomendação. Nós precismos questionar, inclusive
enquanto Ministério Público Federal e dos Estados.
Eu estou fazendo uma conclusão
que eu chamaria de sugestão, também, mas é uma coisa muito, até
certo ponto muito singela, diante de todas as questões que foram
colocadas aqui e sugestões importantes que foram dadas. Eu gostaria
de realçar uma coisa que para mim é muito clara: que a dificuldade
de se implementar toda essa legislação maravilhosa que existe,
antirracista, devido ao racismo institucional que impera, que é
justamente essa maneira de interpretar a lei como se todos fossem
iguais perante a lei e que na hora que você vai apresentar uma
demanda que atinge, especificamente, determinado segmento, esse
cidadão concreto - como Bobbio chamava - o cidadão negro, o
cidadão idoso, a cidadão mulher, esse direito de todos perante a
lei é tido como um impedimento, como um empecilho para implementar
uma ação concreta em favor desses grupos vulneráveis . Na minha
opinião – e isso a gente descobriu também através de pesquisa
feita no Ministério Público de Pernambuco – o racismo
institucional ele impede, é um dado concreto que tem que ser
enfrentado. A gente tem que discutir isso, o Ministério Público, as
Instituições Públicas. Eu falo de Ministério Público e
Magistratura porque nós temos a obrigação maior de implementar a
lei, de interpretar a lei, de fazer a leitura crítica da lei. Então,
nós não fomos acostumados com isso, nós fomos acostumados a essa
mentalidade liberal de que todos são iguais. Então é difícil, a
gente identificou isso nessa pesquisa, de ainda há essa cultura de
que todos são iguais, é muito forte isso, a gente passou a vida
inteira lidando com isso. Então, por isso é preciso que:
Conclusão
Em face das evidências de que
a legislação específica não tem sido suficiente para implementar
as mudanças constantes dos compromissos assumidos pelo Brasil nas
Conferências Mundiais, e
considerando o papel constitucional do Ministério Público
Brasileiro, é necessário que se criem estratégias institucionais
que possibilitem a reflexão sobre o assunto: essas novas demandas,
esses novos direitos. Tais como criação de grupos de trabalho,
discussão, capacitação e sensibilização de membros e servidores
para uma atuação mais adequada às urgentes demandas da sociedade.
Então,
eu deixo isso aqui a título de proposta, de reflexão, porque há
uma resistência muito grande na nossa área de justiça, a
magistratura então nem se fala, é ainda mais resistente. Mas
eu acho que a gente tem que fazer o dever de casa, eu costumo dizer
isso, gente é que tem o papel, inclusive de cobrar da magistratura,
mas se agente não fizer a nossa parte a gente não se habilita a
reivindicar às outras instituições governamentais principalmente.
Eu acho que como Ministério Público Brasileiro nós temos que estar
a serviço desses novos direitos, a serviço dessa legislação e
dessas demandas que são postas pelos movimentos sociais. Lembrando,
inclusive, para finalizar, que na condenação pela Corte
Interamericana de Direitos Humanos do Estado Brasileiro em relação
ao caso de Simone, relembra as recomendações do Relatório da
Comissão que diz o seguinte (recomendando ao Brasil, para uma
cobrança posterior, porque foram os compromissos assumidos na
Plataforma de Durbhan):
- Adotar e instrumentalizar medidas de educação dos funcionários de justiça e de polícia, a fim de evitar ações que impliquem em discriminação nas investigações, no processo ou na condenação civil ou penal, nas denúncias de discriminação racial e racismo;
- Promover o encontro com organismos representantes da imprensa brasileira, com a participação de varias entidades, para que sejam abordadas as questões tratadas na conferência;
- Organizar seminários estaduais com representantes do poder judiciário e ministério público, secretarias de segurança pública locais, com o objetivo de fortalecer a proteção contra a discriminação racial e o racismo;
- Solicitar aos governos estaduais a criação de delegacias especializadas na investigação de crimes de racismo e discriminação racial;
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